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terça-feira, 25 de março de 2014

Dwight Lyman Moody / Célebre ganhador de almas

Dwight Lyman Moody / Célebre ganhador de almas

(1837-1899)


Tudo aconteceu durante uma das famosas campanhas de Moody e Sankey para salvar almas. A noite de uma se­gunda-feira tinha sido reservada para um discurso dirigido aos materialistas. Carlos Bradlaugh, campeão do ceticis­mo, então no zênite da fama, ordenou que todos os membros dos clubes que fundara assistissem à reunião. Assim, cerca de 5000 homens, resolvidos a dominar o culto, entraram e ocuparam todos os bancos.

Moody pregou sobre o texto: " A rocha deles não é como a nossa Rocha, sendo os nossos próprios inimigos os juizes" (Deuteronômio 32.31).

"Com uma rajada de incidentes pertinentes e como­ventes das suas experiências com pessoas presas ao leito de morte, Moody deixou que os homens julgassem por si mes­mos quem tinha melhor alicerce sobre o qual deviam ba­sear sua fé e esperança. Sem querer, muitos dos assistentes tinham lágrimas nos olhos. A grande massa de homens, demonstrando o mais negro e determinado desafio a Deus estampado nos seus rostos, encarou o contínuo ataque de Moody aos pontos mais vulneráveis, isto é, o coração e o lar.

"Ao findar, Moody disse: 'Levantemo-nos para cantar: Oh! vinde vós aflitos! e, enquanto o fazemos, os porteiros abram todas as portas para que possam sair todos os que quiserem. Depois faremos o culto, como de costume, para aqueles que desejarem aceitar o Salvador.' Uma das pes­soas que assistiu a esse culto, disse: 'Eu esperava que todos saíssem imediatamente, deixando o prédio vazio. Mas a grande massa de cinco mil homens se levantou, cantou e assentou-se de novo; nenhum deles deixou seu assento!'

"Moody, então disse: 'Quero explicar quatro palavras: Recebei, crede, confiai, aceitai.' Um grande sorriso passou de um a outro em todo aquele mar de rostos. Depois de fa­lar um pouco sobre a palavra recebei, fez um apelo: 'Quem quer recebê-lo? É somente dizer: Quero.' Cerca de cin­qüenta dos que estavam em pé e encostados às paredes, responderam: 'Quero', mas nenhum dos que estavam sen­tados. Um homem exclamou: 'Eu não posso', ao que Moo­dy replicou: 'Falou bem e com razão, amigo; foi bom ter fa­lado. Escute e depois poderá dizer: Eu posso'. Moody en­tão explicou o sentido da palavra crer e fez o segundo ape­lo: 'Quem dirá: Quero crer nele?' De novo alguns dos ho­mens que estavam em pé responderam, aceitando, mas um dos chefes dirigente dum clube, bradou: 'Eu não quero!' Moody, vencido pela ternura e compaixão, respondeu com voz quebrantada: 'Todos os homens que estão aqui esta noite têm de dizer: Eu quero ou Eu não quero'.

"Então, levou todos a considerarem a história do Filho Pródigo, dizendo: 'A batalha é sobre o querer - só sobre o querer. Quando o Filho Pródigo disse: Levantar-me-ei a luta foi ganha, porque alcançara o domínio sobre a sua própria vontade. É com referência a este ponto que depen­de tudo hoje. Senhores, tendes aí em vosso meio o vosso campeão, o amigo que disse: Eu não quero . Desejo que to­dos aqui, que acreditam que esse campeão tem razão le­vantem-se e sigam o seu exemplo, dizendo: Eu não quero.' Todos ficaram quietos e houve grande silêncio até que, por fim, Moody interrompeu, dizendo: 'Graças a Deus! Ninguém diz: Eu não quero. Agora quem dirá: Eu quero? Instantaneamente parece que o Espírito Santo tomou con­ta do grande auditório de inimigos de Jesus Cristo, e cerca de quinhentos homens puseram-se de pé, as lágrimas ro­lando pelas faces e gritando: 'Eu quero! Eu quero!' Clama­ram até que todo o ambiente se transformou. A batalha foi ganha.

"O culto terminou sem demora, para que se começasse a obra entre aqueles que estavam desejosos de salvação. Em oito dias, cerca de dois mil foram transferidos das filei­ras do inimigo para o exército do Senhor, pela rendição da vontade. Os anos que se seguiram provaram a firmeza da obra, pois os clubes nunca se ergueram. Deus, na sua mise­ricórdia e poder, os aniquilou por seu Evangelho."

Um total de quinhentas mil preciosas almas ganhas para Cristo, é o cálculo da colheita que Deus fez por inter­médio de seu humilde servo, Dwight Lyman Moody. R. A. Torrey, que o conheceu intimamente, considerava-o, com razão, o maior homem do século XIX, isto é, o homem mais usado por Deus para ganhar almas.

Não é exagero dizer que, hoje em dia, muitas décadas depois de sua morte, os crentes se referem ao seu nome mais do que a qualquer outro nome depois dos tempos dos apóstolos.

Que ninguém julgue, contudo, que D. L. Moody era grande em si mesmo ou que tinha oportunidades que os de­mais não têm. Seus antepassados eram apenas lavradores que viveram por sete gerações, ou duzentos anos, no vale do Connecticut, nos Estados Unidos. Dwight nasceu a 5 de fevereiro de 1837, de pais pobres, o sexto entre nove filhos. Quando era ainda pequeno, seu pai faleceu e os credores tomaram conta do que ficou, deixando a família destituída de tudo, até da lenha para aquecer a casa em tempo de in­tenso frio.

Não há história que comova e inspire tanto quanto a daqueles anos de luta da viúva, mãe de Dwight. Poucos meses depois da morte de seu marido, nasceram-lhe gê­meos e o filho mais velho tinha apenas doze anos. O conse­lho de todos os parentes foi que ela entregasse os filhos para outros criarem. Mas com invencível coragem e santa dedicação a seus filhos, ela conseguiu filhos no próprio lar. Guarda-se ainda, como tesouro pre­cioso, sua Bíblia com as palavras de Jeremias 49.11 subli­nhadas: "Deixa os teus órfãos, eu os conservarei em vida; e confiem em mim tuas viúvas."

- "Pode-se esperar outra coisa a não ser que os filhos fi­cassem ligados à mãe e que crescessem para se tornarem homens e mulheres que conhecessem o mesmo Deus que ela conhecia?" - Assim se expressou Dwight, ao lado do ataúde quando ela faleceu com a idade de noventa anos: -"Se posso conter-me, quero dizer algumas palavras. É grande honra ser filho de uma mãe como ela. Já viajei mui­to, mas nunca encontrei alguém como ela. Ligava a si seus filhos de tal maneira que representava um grande sacrifí­cio para qualquer deles afastar-se do lar. Durante o pri­meiro ano depois que meu pai faleceu, ela adormecia todas as noites chorando. Contudo, estava sempre alegre e ani­mada na presença dos filhos. As saudades serviam para chegá-la mais perto de Deus. Muitas vezes eu me acordava e ela estava orando, às vezes, chorando. Não posso expres­sar a metade do que desejo dizer. Aquele rosto, como é querido! Durante cinqüenta anos não senti gozo maior do que o gozo de voltar a casa. Quando estava ainda a setenta e cinco quilômetros de distância, já me sentia tão inquieto e desejoso de chegar que me levantava do assento para passear pelo carro até o trem chegar à estação... Se chega­va depois de anoitecer, sempre olhava para ver a luz na ja­nela da minha mãe. Senti-me tão feliz esta vez por chegar a tempo de ela ainda me reconhecer! Perguntei-lhe: -'Mãe, me conhece?' Ela respondeu: - 'Ora, se eu te conhe­ço!' Aqui está a sua Bíblia, assim gasta, porque é a Bíblia do lar; tudo que ela tinha de bom veio deste livro e foi dele que nos ensinou. Se minha mãe foi uma bênção para o mundo é porque bebia desta fonte. A luz da viúva brilhou do outeiro durante cinqüenta anos. Que Deus a abençoe, mãe; ainda a amamos! Adeus, por um pouco, mãe!"

Ao contemplar o êxito de Dwight L. Moody, somos constrangidos a acrescentar: - Quem pode calcular as pos­sibilidades de um filho criado num lar onde os pais amam sinceramente ao Pai celestial a ponto de chamar diariamente todos os filhos para escutarem a sua voz na leitura da Bíblia e reverentemente clamarem a Ele em oração? Todos os filhos da viúva Moody assistiam aos cultos nos domingos; levavam merenda para passar o dia inteiro na igreja. Tinham de ouvir dois prolongados sermões e, no intervalo, assistir à Escola Dominical. Dwight, depois de trabalhar a semana inteira, achava que sua mãe exigia de­mais obrigando-o a assistir aos sermões, os quais não com­preendia. Mas, por fim, chegou a ser agradecido a essa boa mãe pela dedicação nesse sentido.

Com a idade de dezessete anos, Moody saiu de casa para trabalhar na cidade de Boston, onde achou emprego na sapataria de um seu tio. Continuou a assistir aos cultos, mas ainda não era salvo.

Notai bem, os que vos dedicais à obra de ganhar almas: não foi num culto que Dwight Moody foi levado ao Salva­dor. Seu professor da Escola Dominical, Eduardo Kimball, conta:


"Resolvi falar-lhe acerca de Cristo e de sua alma. Vaci­lei um pouco em entrar na sapataria, não queria embara­çar o moço durante as horas de serviço. Por fim, entrei, re­solvido a falar sem mais demora. Achei Moody nos fundos da loja, embrulhando calçados. Aproximei-me logo dele e, colocando a mão sobre seu ombro, fiz o que depois parecia-me um apelo fraco, um convite para aceitar a Cristo. Não me lembro do que eu disse, nem mesmo Moody podia lembrar-se alguns anos depois. Simplesmente falei do amor de Cristo para com ele, e o amor que Cristo esperava dele, de volta. Parecia-me que o moço estava pronto para receber a luz que o iluminou naquele momento e, lá nos fundos da sapataria, entregou-se a Cristo."

Na história dos crentes, através dos séculos, não há crente que fosse, no zelo, menos remisso e, no espírito, mais fervoroso em servir ao Senhor, desde a conversão até o dia da morte, do que Moody de Northfield. Quantas ve­zes depois, o senhor Kimball dava graças a Deus por não ter sido desobediente à visão celestial; qual teria sido o re­sultado se não tivesse falado ao moço naquela manhã na sapataria?!Era costume das igrejas daquela época, alugarem os as­sentos. Moody, logo depois da sua conversão, transbordan­do de amor para com seu Salvador, pagou aluguel de um banco, percorrendo as ruas, hotéis e casas de pensão solici­tando homens e meninos para enchê-lo em todos os cultos. Depois alugou mais um, depois outro, até conseguir encher quatro bancos, todos os Domingos. Mas isso não era sufi­ciente para satisfazer o amor que sentia para com os perdi­dos. Certo domingo visitou uma Escola Dominical em ou­tra rua. Pediu permissão para ensinar também, uma clas­se. O dirigente respondeu: "Há doze professores e dezesseis alunos, porém o senhor pode ensinar todos os alunos que conseguir trazer à escola." Foi grande a surpresa de todos quando Moody, no domingo seguinte, entrou com dezoito meninos da rua, sem chapéu, descalços e de roupa suja e esfarrapada, mas, como ele disse: "Todos com uma alma para ser salva." Continuou a levar cada vez mais alunos à Escola até que, alguns domingos depois, no prédio não ca­biam mais; então resolveu abrir outra escola em outra par­te da cidade. Moody não ensinava, mas arranjava profes­sores, providenciava o pagamento do aluguel e de outras despesas. Em poucos meses essa Escola veio a ser a maior da cidade de Chicago. Não julgando conveniente pagar ou­tros para trabalhar no Domingo, Moody, cedo, pela ma­nhã, tirava as pipas de cerveja (outros ocupavam o prédio durante a semana), varria e preparava tudo para o funcio­namento da escola. Depois, então, saía para convidar alu­nos. Às duas horas, quando voltava de fazer os convites, achava o prédio repleto de alunos.

Depois de findar a escola, ele visitava os ausentes e convidava todos para ouvirem a pregação, à noite. No ape­lo, após o sermão, todos os interessados eram convidados a ficar para um culto especial, no qual tratavam individual­mente com todos. Moody também participava nessa co­lheita de almas.

Antes de findar o ano, 600 alunos, em média, assistiam à Escola Dominical, divididos em 80 classes. A seguir a as­sistência subiu a 10000 e, às vezes, a 1500.

O êxito de Moody na Escola Dominical atraiu a aten­ção de outros que se interessavam pelo mesmo trabalho.De vez em quando era convidado a participar nas grandes convenções das Escolas Dominicais. Certa vez, depois de Moody haver falado numa convenção, um orador censu­rou-o severamente por não saber dirigir-se a um auditório. Moody foi para a frente, e depois de explicar que reconhe­cia não ser instruído, agradeceu ao ministro por ter mos­trado seus defeitos e pediu-lhe que orasse a Deus para que o ajudasse a fazer o melhor que pudesse.

Ao mesmo tempo que Moody se aplicava à Escola Do­minical com tais resultados, esforçava-se, também, no co­mércio todos os dias. O grande alvo da sua vida era vir a ser um dos principais comerciantes do mundo, um multi­milionário. Não tinha mais de 23 anos e já tinha ajuntado 7000 dólares! Mas seu Salvador tinha um plano ainda mais nobre para seu servo.

Certo dia, um dos professores da Escola Dominical en­trou na sapataria onde Moody negociava. Informou-o de que estava tuberculoso e que, desenganado pelo médico, resolvera voltar para Nova Iorque e aguardar a morte. Confessou-se muito perturbado, não porque tinha de mor­rer, mas porque até então não conseguira levar ao Salvador nenhuma das moças da sua classe da Escola Dominical. Moody, profundamente comovido, sugeriu que visitassem juntos as moças em suas casas, uma por uma. Visitaram uma, o professor falou-lhe seriamente acerca da salvação da sua alma. A moça deixou seu espírito leviano e começou a chorar, entregando-se ao seu Salvador. Todas as outras moças que foram visitadas naquele dia fizeram o mesmo.

Passados dez dias, o professor foi novamente à sapata­ria. Com grande gozo informou a Moody que todas as mo­ças se haviam entregado a Cristo. Resolveram então convi­dar todas para um culto de oração e despedida na véspera da partida do professor para Nova Iorque. Todos se ajoe­lharam e Moody, depois de fazer uma oração, estava para se levantar quando uma das moças começou, também, a orar. Todos oraram suplicando a Deus em favor do profes­sor. Ao sair Moody suplicou: "Ó Deus, permite-me morrer antes de perder a bênção que recebi hoje aqui!"Moody, mais tarde, confessou: "Eu não sabia o preço que tinha de pagar, como resultado de haver participado na evangelização individual das moças. Perdi todo jeito de negociar; não tinha mais interesse no comércio. Experi­mentara um outro mundo e não mais queria ganhar di­nheiro... Oh! delícia, a de levar uma alma das trevas deste mundo à gloriosa luz e liberdade do Evangelho!"

Então, não muito depois de casar-se, com a idade de vinte e quatro anos, Moody deixou um bom emprego com o salário de cinco mil dólares por ano, um salário fabuloso naquele tempo, para trabalhar todos os dias no serviço de Cristo, sem ter promessa de receber um único cêntimo. De­pois de tomar essa resolução, apressou-se em ir à firma B. F. Jacobs & Cia., onde, muito comovido, anunciou: - "Já resolvi empregar todo o meu tempo no serviço de Deus!" -"Como vai manter-se?" - "Ora, Deus me suprirá de tudo, se Ele quiser que eu continue; e continuarei até ser obriga­do a desistir."

É muito interessante notar o que ele escreveu não mui­to depois, a seu irmão Samuel: "Caro irmão: As horas mais alegres que já experimentei na terra foram as que passei na obra da Escola Dominical. Samuel, arranja uma classe de moços perdidos leva-os à Escola Dominical e pede a Deus sabedoria, e instrui-os no caminho da vida eterna!" Ao mesmo tempo em que Moody descrevia a sua alegria, foi obrigado a deixar a pensão, a alimentar-se mais simples­mente e a dormir num dos bancos do salão.

Acerca de seu desprendimento pelo dinheiro, R. A. Tor-rey fez esta observação: "Ele (Moody) disse-me que, se ti­vesse aceitado lucros provenientes da venda dos hinários por ele publicados, eles somariam um milhão de dólares. Porém Moody recusou-se a tocar naquele dinheiro, embora por direito fosse seu... Numa certa cidade visitada por Moody nos últimos dias de sua vida, estando eu em sua companhia, foi publicamente anunciado que ele não acei­taria qualquer recompensa por seus serviços. O fato era que ele quase não tinha outros meios de sustento senão aquilo que recebia nas suas conferências, todavia ele não comentou o anúncio feito, mas saiu daquela cidade sem re­ceber um centavo sequer pelo seu árduo trabalho; e, pare­ce-me, que foi ele mesmo quem pagou sua conta no hotel onde se hospedara."

A parte da biografia de D. L. Moody que trata dos pri­meiros anos do seu ministério está repleta de proezas feitas na carne. Mencionamos aqui apenas uma, isto é, o fato de Moody fazer 200 visitas em um só dia. Ele mesmo mais tarde se referia àqueles anos como uma manifestação do "zelo de Deus, mas sem entendimento", acrescentando: Há, contudo muito mais esperança para o homem com zelo e sem entendimento do que para o homem de entendi­mento sem zelo."

Rompeu a tremenda Guerra Civil e Moody chegou com os primeiros soldados ao acampamento militar onde ar­mou uma grande tenda para os cultos. Depois ajuntou di­nheiro e levantou um templo onde dirigiu 1500 cultos du­rante a guerra. Uma pessoa que o conhecia assim comen­tou sua ação: "Moody precisa estar constantemente em to­dos os lugares, dia e noite, nos domingos e todos os dias da semana; orando, exortando, tratando com os soldados acerca das suas almas, regozijando-se nas oportunidades abundantes de trabalhar no grande fruto ao seu alcance por causa da guerra."

Depois de findar a guerra, dirigiu uma campanha para levantar em Chicago um prédio para os cultos, com capa­cidade para três mil pessoas. Quando, mais tarde esse edifício foi destruído por um incêndio, ele e dois outros ini­ciaram outra campanha, antes de os escombros haverem esfriado, para levantar novo edifício. Trata-se do Farwell Hall II, que se tornou um grande centro religioso em Chi­cago. O segredo desse êxito foram os cultos de oração que se realizavam diariamente, ao meio-dia, precedidos por uma hora de oração de Moody, escondido no vão debaixo da escada.

No meio desses grandes esforços, Moody resolveu, ines­peradamente, fazer uma visita à Inglaterra.

Em Londres, antes de tudo, foi ouvir Spurgeon pregar no Metropolitan Tabernacle. Já tinha lido muito do que "o príncipe dos pregadores" escrevera, mas ali pôde verificar que a grande obra não era de Spurgeon, mas de Deus, e saiu de lá com uma outra visão.

Visitou Jorge Müller e o orfanato em Bristol. Desde aquele tempo a Autobiografia de Müller exerceu tanta in­fluência sobre ele como já o tinha feito "O Peregrino", de Bunyan.

Entretanto, nessa viagem, o que levou Moody a buscar definitivamente uma experiência mais profunda com Cris­to, foram estas palavras proferidas por um grande ganha­dor de almas de Dubim, Henrique Varley: "O mundo ain­da não viu o que Deus fará com, para, e pelo homem intei­ramente a Ele entregue." Moody disse consigo mesmo: "E­le não disse por um grande homem, nem por um sábio, nem por um rico, nem por um eloqüente, nem por um inte­ligente, mas simplesmente por um homem. Eu sou um ho­mem, e cabe ao homem mesmo resolver se deseja ou não consagrar-se assim. Estou resolvido a fazer todo o possível para ser esse homem." Apesar de tudo isso, Moody, depois de voltar à América, continuava a se esforçar e a empregar métodos naturais. Foi nessa época que a cidade de Chicago foi reduzida a cinzas no pavoroso incêndio de 1871.

Na noite do início do pavoroso incêndio, Moody pregou sobre este tema: - "Que farei, então, de Jesus, chamado Cristo?" Ao concluir seu sermão, ele disse ao auditório, o maior a que pregara em Chicago: "Quero que leveis esse texto para casa e nele mediteis bem durante a semana e no domingo vindouro iremos ao Calvário e à cruz e resolvere­mos o que faremos de Jesus de Nazaré."

- "Como errei!" disse Moody, depois. - "Não me atrevo mais a conceder uma semana de prazo ao perdido para de­cidir sobre a salvação. Se se perderem serão capazes de se levantar contra mim no dia do juízo. Lembro-me bem de como Sankey cantou e como sua voz soou quando chegou a estrofe de apelo: "O Salvador chama para o refúgio. Rom­pe a tempestade e breve vem a morte."

"Nunca mais vi aquele auditório. Ainda hoje desejo chorar... Prefiro ter a mão direita decepada, a conceder ao auditório uma semana para decidir o que fará de Jesus. Muitos me censuram dizendo: - "Moody, o senhor quer que o povo se decida imediatamente. Por que não lhe dá tempo para consultar?"

"Tenho pedido a Deus muitas vezes que me perdoe por ter dito naquela noite que podiam passar oito dias para considerar, e se Ele poupar minha vida não o farei de novo."

O grande incêndio rugiu e ameaçou durante quatro dias; consumindo Farwell Hall, o templo de Moody e a sua própria residência. Os membros da igreja foram todos dis­persos. Moody reconheceu que a mão de Deus o castigara para o ensinar, e isso tornou-se para ele motivo de grande regozijo.

Foi a Nova Iorque, a fim de granjear dinheiro para os flagelados do grande sinistro. Acerca do que se passou, ele mesmo escreveu: "Não sentia o desejo no coração de solici­tar dinheiro. Todo o tempo eu clamava a Deus pedindo que me enchesse do seu Espírito. Então, certo dia, na cida­de de Nova Iorque - Ah! que dia! Não posso descrevê-lo, nem quero falar no assunto; é experiência quase sagrada demais para ser mencionada. O apóstolo Paulo teve uma experiência acerca da qual não falou por catorze anos. Pos­so apenas dizer que Deus se revelou a mim e tive uma ex­periência tão grande do seu amor que tive de rogar-lhe que retirasse de mim sua mão. Voltei a pregar. Os sermões não eram diferentes; não apresentei outras verdades; contudo, centenas se converteram. Não quero voltar para viver de novo como vivi outrora nem que eu pudesse possuir o mun­do inteiro."

Acerca dessa experiência, um de seus biógrafos acres­centou: "O Moody que andava na rua parecia outro. Nun­ca jamais bebera mosto, mas então conhecia a diferença entre o júbilo que Deus dá e o falso júbilo de Satanás. En­quanto andava, parecia-lhe que um pé dizia a cada passo, 'Glória!' e o outro respondia, 'Aleluia!'. O pregador rom­peu em soluços, balbuciando: 'Ó Deus, constrange-nos an­dar perto de ti para todo o sempre.'"

Sobre o mesmo acontecimento, ainda outro escreveu o seguinte: "O fruto da sua pregação tinha sido pequeno. Angustiado em espírito, ele andava pelas ruas da grande cidade de noite orando: 'Ó Deus unge-me com teu Espírito!' - Deus ouviu e concedeu-lhe lá mesmo na rua, aquilo por que rogava. Sua vida anterior era como se experimen­tasse puxar água dum poço que parecia seco. Fazia funcio­nar a bomba com toda a força, mas tirava muito pouca água. Agora Deus fez sua alma como um poço artesiano onde nunca falta água. Assim chegou a compreender o que significam as palavras: "A água que eu lhe der, virá a ser nele uma fonte de água que mana para a vida eterna."

O Senhor supriu dinheiro para Moody construir um edifício provisório para realizar os cultos em Chicago. Era de madeira rústica, forrado de papel grosso para evitar o frio; o teto era sustentado por fileiras de estacas colocadas no centro. Nesse templo provisório realizaram-se os cultos, durante três anos, no meio dum deserto de cinzas. A maior parte do trabalho de construção fora feita pelos membros que moravam em ranchos ou mesmo em lugares escavados por debaixo das calçadas das ruas. Ao primeiro culto assis­tiram mais de mil crianças com seus respectivos pais!

Esse templo provisório serviu de morada para Moody e Sankey, seu evangelista-cantor; eram tão pobres como os outros em redor, mas tão cheios de esperança e gozo que conseguiram levar muitos a Cristo e se tornarem ricos, apesar de nada possuírem. Onda após onda de avivamento passou sobre o povo. Os cultos continuavam dia e noite, quase sem cessar, durante alguns meses. Multidões chora­vam seus pecados, às vezes dias inteiros e no dia seguinte, perdoados, clamavam e louvavam em gratidão a Deus. Homens e mulheres até então desanimados participavam do gozo transbordante de Moody, transformado pelo batis­mo com o Espírito Santo.

Não muito depois de haver construído o templo perma­nente (com assentos para 2000 pessoas - e sem endividar-se), Moody fez a sua segunda viagem à Inglaterra. Nos seus primeiros cultos nesse país, encontrou igrejas frias, com pouca assistência e o povo sem interesse nas suas mensagens. Mas a unção do Espírito, que Moody recebera nas ruas de Nova Iorque, ainda permanecia na sua alma e Deus o usou como seu instrumento para um avivamento mundial.

Não desejava métodos sensacionais, mas usou os mesmos métodos humildes até o fim da vida: sermão dirigido direto aos ouvintes; aplicação prática da mensagem do Evangelho à necessidade individual; solos cantados sob a unção do Espírito; apelo para que o perdido se entregasse imediatamente; uma sala no lado aonde levava os que se achavam em "dificuldades" em aceitar a Cristo; a obra que depois os salvos faziam entre os "interessados" e re­cém-convertidos; diariamente uma hora de oração ao meio-dia, e cultos que duravam dias inteiros.

O próprio Moody disse estas palavras: "Se estamos cheios do Espírito, e de poder, um dia de serviço com poder vale mais do que um ano de serviço sem esse poder." Outra vez acrescentou: "Se estamos cheios do Espírito, ungidos, nossas palavras alcançarão os corações do povo."

Na Inglaterra, as cidades de York, Senderland, Bishop, Auckland, Carlisle e Newcastle foram vivificadas como nos dias de Whitefield e Wesley. Na Escócia, em Edinburgh, os cultos se realizaram no maior edifício e "a cidade inteira ficou comovida." Em Glasgow, a obra começou com uma reunião de professores da Escola Dominical, a que assistiram mais de 3000. O culto de noite foi anuncia­do para às 6,30, mas muito antes da hora marcada, o gran­de edifício ficou repleto e a multidão que não pôde entrar foi levada para as quatro igrejas mais próximas. Essa série de cultos transformou radicalmente a vida diária do povo. Na última noite Sankey cantou para 7000 pessoas que es­tavam dentro do edifício, e Moody, sem poder entrar no auditório, subiu numa carruagem e pregou a 20 mil pes­soas que se achavam congregadas do lado de fora. O coral cantou os hinos de cima dum galpão. Em um só culto mais de 2000 pessoas responderam ao apelo para se entregarem definitivamente a Cristo.

Durante o verão, pregou em Aberdeen, Montrose, Brechin, Forfar, Huntley, Inverness, Arbroath, Fairn, Nairn, Elgin, Ferres, Grantown, Keith, Rothesay e Campbel-town; muitos milhares assistiam a todos os cultos.

Na Irlanda, Moody pregou nos maiores centros com os mesmos resultados, como na Inglaterra e Escócia. Os cul­tos em Belfast continuaram durante quarenta dias. O últi­mo culto foi reservado para os recém-convertidos, que só podiam ter ingresso por meio de bilhetes, concedidos gra­tuitamente. Assistiram 2.300 pessoas. Belfast fora o centro de vários avivamentos, mas todos concordam em que nun­ca houvera um avivamento antes desse de resultados tão permanentes.

Depois da campanha na Irlanda, Moody e Sankey vol­taram à Inglaterra e dirigiram cultos inesquecíveis em Shefield, Manchester, Birgmingham e Liverpool. Durante muitos meses, os maiores edifícios dessas cidades ficaram superlotados de multidões desejosas de ouvirem a apresen­tação clara e ousada do Evangelho por um homem livre de todo o interesse e ostentação. O poder do Espírito se mani­festou em todos os cultos produzindo resultados que per­manecem até hoje.

O itinerário de Moody e Sankey na Europa, findou-se após quatro meses de cultos em Londres. Moody pregava alternadamente em quatro centros. Os seguintes algaris­mos nos servem para compreender algo da grandeza dessa obra durante os quatro meses: Realizaram-se 60 cultos em Agricultural Hall, aos quais um total de 720.000 pessoas assistiram; em Bow Road Hall, 60 cultos, aos quais 600.000 assistiram; em Camberwell Hall, 60 cultos, com a assistên­cia de 480.000; Haymarket Opera House, 60 cultos, 330.000; Vitória Hall, 45 cultos, 400.000 assistentes.

Como é glorioso acrescentar aqui o seguinte: "As dife­renças entre as denominações quase desapareceram. Pre­gadores de todas as igrejas cooperavam numa plataforma comum para a salvação dos perdidos. Abriram-se de novo as bíblias e houve um grande interesse pelo estudo da Pa­lavra de Deus."

Quando Moody saiu dos Estados Unidos em 1873, era conhecido apenas em alguns Estados e tinha fama, apenas como obreiro de Escola Dominical e da Associação Cristã de Moços. Mas quando voltou da campanha na Inglaterra em 1875, era conhecido como o mais famoso pregador do mundo. Contudo continuou o mesmo humilde servo de Deus. Foi assim que uma pessoa que o conhecia intima­mente descreveu sua personalidade: "Creio que era a pes­soa mais humilde que jamais conheci... Ele não fingia hu­mildade. No íntimo do seu coração rebaixava-se a si mes-mo e superestimava os outros. Ele engrandecia outros ho­mens, e, sempre que possível arranjava para que eles pre­gassem. Fazia tudo para não aparecer."

Ao chegar novamente aos Estados Unidos, Moody rece­beu convites, para pregar, de todas as partes do País. Sua primeira campanha (em Brooklyn) foi um modelo para to­das as outras. As denominações cooperavam; alugaram um prédio que comportava 3000 pessoas. O resultado foi uma grande e permanente obra.

Durante um período de vinte anos, ele dirigiu campa­nhas com grandes resultados nas maiores cidades dos Es­tados Unidos, Canadá e México. Em diversos lugares as campanhas duraram até seis meses. Em todos os lugares Moody proclamava clara e praticamente a mensagem do Evangelho.

Nas suas campanhas havia ocasiões que eram realmen­te dramáticas. Em Chicago, o Circo Forepaugh, com uma tenda de lona que tinha assentos para 10.000 pessoas e lu­gares para outras 10.000 em pé, anunciou representações para dois domingos. Moody alugou a tenda para os cultos de manhã, os donos achando muita graça em tal tentativa. Mas no primeiro culto a tenda ficou repleta. Foram tão poucos os que assistiram às representações do circo à tar­de, que os donos resolveram não fazer sessão no segundo domingo. Entretanto, o culto realizou-se sob a lona no se­gundo domingo, o calor era tanto que dava a impressão de matar a todos, porém 18.000 pessoas ficaram em pé, ba­nhados em suor e esquecidos do calor. No silêncio que rei­nava durante a pregação de Moody, o poder desceu e cen­tenas foram salvos. Acerca de um desses cultos certo assis­tente deu estas impressões:

"Nunca jamais me esquecerei de certo sermão que Moody pregou. Foi no Circo de Forepaugh durante a Expo­sição Mundial. Estavam presentes 17.000 pessoas, de to­das as classes e de todas as qualificações. O texto do ser­mão foi: Pois o Filho do homem veio buscar e salvar o que se havia perdido.' Grandiosa era a unção do pregador; pa­recia que estava em íntimo contacto com todos os corações daquela massa de gente. Moody disse repetidamente: Pois o Filho do homem veio - veio hoje ao Circo Forepaugh - para procurar e salvar o que se perdera.' Escrito e impres­so, isso parece um sermão comum, mas as suas palavras, pela santa unção que lhe sobreveio, tornaram-se palavras de espírito e de vida."

Durante a Exposição Mundial, no dia designado em honra de Chicago, todos os teatros da cidade fecharam, porque se esperava que todo o mundo fosse à Exposição a seis quilômetros de distância. Porém Moody alugou o Cen­tral Music Hall e R. A. Torrey testificou que a assistência era tão grande, que ele só conseguiu entrar por uma janela dos fundos do prédio. Os cultos de Moody continuaram tão concorridos que a Exposição Mundial teve de deixar de funcionar aos domingos, por falta de assistência.

Henrique Moorehouse, pregador escocês, dá a seguinte opinião acerca dos discursos de Moody:

1) "Crê firmemente que o Evangelho salva os pecado­res, quando eles crêem, e confia na história simples do Sal­vador crucificado e ressuscitado.

2) "Espera a salvação de almas, quando prega, e o re­sultado é que Deus honra a sua fé.

3) "Prega como se nunca jamais se realizasse outro cul­to e como se os pecadores nunca mais tivessem oportuni­dade de ouvir o som do Evangelho. Seus apelos a decisão agora mesmo são comoventes.

4) "Consegue levar os crentes a trabalhar com os inte­ressados depois do sermão. Insiste em que perguntem aos que estão assentados ao lado se são salvos ou não. Tudo na sua obra é muito simples e aconselho os obreiros da seara do Senhor a aprenderem de nosso amado irmão algumas li­ções preciosas sobre a obra de ganhar almas."

O doutor Dale disse: "Acerca do poder de Moody, acho difícil falar. É tão real e ao mesmo tempo tão diferente do poder dos demais pregadores, que não sei descrevê-lo. Sua realidade é inegável. Um homem que pode cativar o inte­resse de um auditório de três a seis mil pessoas, por meia hora, de manhã, por quarenta minutos, de novo, ao meio-dia e de um terceiro auditório, de 13 a 15 mil, durante qua­renta minutos, à noite, deve ter um poder extraordinário."

Acerca desse poder maravilhoso, Torrey testificou: "Várias vezes tenho ouvido diversas pessoas dizerem que viajaram grandes distâncias para ver e ouvir D. L. Moody, e que ele, de fato, é um maravilhoso pregador. Sim, ele era em verdade um maravilhoso pregador; considerando tudo, o mais maravilhoso que eu jamais ouvi; era grande o privi­légio de ouvi-lo pregar, como só ele sabia pregar. Contudo, conhecendo-o intimamente, quero testificar que Moody era maior como intercessor do que como pregador. Enfren­tando obstáculos aparentemente invencíveis, ele sabia vencer todas as dificuldades. Sabia, e cria no mais profun­do de sua alma, que não havia nada demasiadamente difí­cil para Deus fazer, e que a oração podia conseguir tudo que Deus pudesse realizar."

Certo dia, na sua grande campanha em Londres, Moo­dy estava pregando num teatro repleto de pessoas da alta sociedade, e entre elas havia um membro da família real. Moody levantou-se e leu Lucas 4.27: "E havia muitos le­prosos em Israel no tempo do profeta Eliseu..." Ao chegar à palavra "Eliseu", ele não a podia pronunciar e começou a gaguejar e balbuciar. Começou a ler o versículo de novo, mas de novo não podia passar adiante. Experimentou a terceira vez e falhou pela terceira vez. Então fechou o livro e muito comovido olhou para cima, dizendo: "Ó Deus! use esta língua de gago para proclamar Cristo crucificado a este povo!" Desceu sobre ele o poder de Deus e ele derra­mou sua alma em tal torrente de palavras que o auditório inteiro ficou como que derretido pelo fogo divino.

Foi durante essa segunda visita às Ilhas Britânicas que fez a sua obra entre os homens das suas célebres universi­dades, Oxford e Cambridge. É uma história muitas vezes repetida de como ele, sem instrução, mas, com a graça de Deus e diplomacia, venceu a censura e fez entre os intelec­tuais o que alguns consideram a maior obra da sua vida.

Apesar de Moody não ter instrução acadêmica, reco­nhecia o grande valor da educação e sempre aconselhava a mocidade a se preparar para manejar bem a Palavra de Deus. Reconhecia a grande vantagem da instrução tam­bém para os que pregam no poder do Espírito Santo. Ain­da existem três grandes monumentos às suas convicções nesse ponto - as três escolas que ele fundou: O Instituto Bíblico em Chicago, com 38 prédios e 16000 alunos matriculados nas aulas diurnas, noturnas e Cursos por Corres­pondência; o Northfield Seminário, com 490 alunos, e a Escola do Monte Hermom, com 500 alunos.

Entretanto, ninguém se engane como alguns desses alunos e como diversos crentes entre nós, pensando que o grande poder de Moody era mais intelectual do que espiri­tual. Nesse ponto ele mesmo falava com ênfase: para maior clareza, citamos o seguinte de seus "Short Talks": "Não conheço coisa mais importante que a América preci­se do que de homens e mulheres inflamados com o fogo do Céu; nunca encontrei um homem (ou uma mulher) infla­mado com o Espírito de Deus que fracassasse. Creio que isso seja mesmo impossível; tais pessoas nunca se sentem desanimadas. Avançam mais e mais e se animam mais e mais. Amados, se não tendes essa iluminação, resolvei ad­quiri-la, e orai: 'Ó Deus ilumina-me com o teu Espírito Santo!'"

No que R. A. Torrey escreveu aparece o espírito dessas escolas que fundou:

"Moody costumava escrever-me antes de iniciar uma nova campanha, dizendo: Pretendo dar início ao trabalho no lugar tal e em tal dia; peço-lhe que convoque os estu­dantes para um dia de jejum e oração.' Eu lia essas cartas aos estudantes e lhes dizia: Moody deseja que tenhamos um dia de jejum e oração para pedir, primeiramente, as bênçãos divinas sobre nossas próprias almas e nosso traba­lho! Muitas vezes ficávamos ali na sala das aulas até alta noite - ou mesmo até a madrugada - clamando a Deus, porque Moody nos exortava a esperar até que recebêsse­mos a bênção. Quantos homens e mulheres não tenho eu conhecido, cujas vidas e caracteres foram transformados por aquelas noites de oração, e quantos têm conseguido grandes coisas, em muitas terras, como resultado daquelas horas gastas em súplicas a Deus!

"Até o dia da minha morte não poderei esquecer-me de 8 de julho de 1894. Era o último dia da Assembléia dos Es­tudantes de Northfield... Às 15 horas reunimo-nos em frente à casa da progenitora de Moody... Havia 456 pessoas em nossa companhia... Depois de andarmos alguns minu­tos, Moody achou que podíamos parar. Nós nos sentamos nos troncos de árvores caídas, em pedras, ou no chão. Moody então franqueou a palavra, dando licença para qual­quer estudante expressar-se. Uns 75 deles, um após outro, levantaram-se, dizendo: 'Eu não pude esperar até às 15 ho­ras, mas tenho estado sozinho com Deus desde o culto de manhã e creio que posso dizer que recebi o batismo com o Espírito Santo.' Ouvindo o testemunho desses jovens, Moody sugeriu o seguinte: 'Moços, por que não podemos ajoelhar-nos aqui, agora, e pedir que Deus manifeste em nós o poder do seu Espírito de um modo especial, como fez aos apóstolos no dia de Pentecoste?' E ali na montanha oramos.

"Na subida, tínhamos notado como se iam acumulan­do nuvens pesadas; no momento em que começamos a orar, principiou a chuva a cair sobre os grandes pinheiros e sobre nós. Porém houve uma outra qualidade de nuvem que há dez dias estava se acumulando sobre a cidade de Northfield - uma nuvem cheia da misericórdia, da graça e do poder divino, de sorte que naquela hora parecia que nossas orações bombardeavam essas nuvens, fazendo des­cer sobre nós, em grande poder, a virtude do Espírito San­to.

"Homens e mulheres, eis o de que todos nós carecemos - o batismo com o Espírito Santo!"

Que Moody mesmo era um estudante incansável, vê-se no seguinte:

"Todos os dias da sua vida, até o fim, segundo creio, ele se levantava muito cedo de manhã para meditar na Pala­vra de Deus. Costumava deixar sua cama às quatro horas da madrugada, mais ou menos, para estudar a Bíblia. Um dia ele me disse: Tara estudar, preciso me levantar antes que as outras pessoas acordem'. Ele se fechava num quarto afastado do resto da família, sozinho com a sua Bíblia e com o seu Deus.

"Pode-se falar em poder, porém, ai do homem que ne­gligenciar o único Livro dado por Deus, que serve de ins­trumento, por meio do qual Ele dá e exerce seu poder. Um homem pode ler inúmeros livros e assistir a grandes con­venções; pode promover reuniões de oração que durem noi­tes inteiras, suplicando o poder do Espírito Santo, mas se tal homem não permanecer em contato íntimo e constante com o único Livro, a Bíblia, não lhe será concedido o po­der. Se já tem alguma força não conseguirá mantê-la, se­não pelo estudo diário, sério e intenso desse Livro."

Tudo no mundo tem de findar; chegou o tempo tam­bém para D. L. Moody findar o seu ministério aqui na ter­ra. Em 16 de novembro de 1899, no meio de sua campanha em Kansas City, com auditórios de 15.000 pessoas, pregou seu último sermão. É provável que soubesse que seria o úl­timo: certo é que seu apelo era ungido com poder vindo do Alto e centenas de almas foram ganhas para Cristo.

Para a nação, a sexta-feira, 22 de dezembro de 1899, foi o dia mais curto do ano, mas para D. L. Moody, foi o dia que clareou, foi o começo do dia que nunca findará. Às seis horas da manhã dormiu um ligeiro sono. Então os seus queridos ouviram-no dizer em voz clara: "Se isto é a mor­te, não há nenhum vale. Isto é glorioso. Entrei pelas portas e vi as crianças! (Dois de seus netos já falecidos). A terra recua; o céu se abre perante mim. Deus está me chaman­do!" Então virou-se para a sua esposa, a quem ele queria mais do que a todas as pessoas, a não ser Cristo, e disse: "Tu tens sido para mim uma boa esposa."

No singelo culto fúnebre, Torrey, Scofield, Sankey e outros falaram à grande multidão comovida que assistiu. Depois o ataúde foi levado pelos alunos da Escola Bíblica de Monte Hermom a um lugar alto que ficava próximo, chamado "Round Top". Três anos depois, a fiel serva de Deus, Ema Moody, sua esposa, também dormiu em Cristo e foi enterrada ao lado do marido, no mesmo alto, onde permanecerão até o glorioso dia da ressurreição.

Contemplemos de novo, por um momento, a vida ex­traordinária desse grande ganhador de almas. Quando o jovem Moody chorava sob o poder do alto na pregação do jovem Spurgeon, foi inspirado a exclamar: "Se Deus pode usar Spurgeon, Ele me pode usar também". A biografia de Moody é a história de como ele vivia completamente sub­misso a Deus, para esse fim. R. A. Torrey disse: "O primei­ro fator por cujo motivo Moody foi instrumento tão útil nas mãos de Deus é que ele era um homem inteiramente
sub­misso à vontade divina. Cada grama daquele corpo de 127quilos pertencia ao Senhor; tudo que ele era e tudo que ti­nha pertencia inteiramente a Deus... Se nós, tu e eu, leitor, queremos ser usados por Deus, temos de nos submeter a Ele absolutamente e sem reservas."

Leitor, resolve agora, com a mesma determinação e pelo auxílio divino: "Se Deus podia usar Dwight Lyman Moody, Ele me pode usar também!"

Que assim seja! Amém!

(estraido do livro hérois da fé)

Jônatas Goforth / «por meu espírito»

Jônatas Goforth / «por meu espírito»


(1859-1936)

Certo dia, no ano de 1900, em Changte, no interior da China, passou um correio galopando à doida. Levava um despacho da imperatriz para o governador, ordenando que tomasse medidas para exterminar imediatamente todos os estrangeiros. Na horrenda carnificina que se seguiu, Jônatas Goforth, com sua esposa e filhinhos, foram cercados por milhares de Boxers, determinados a tirar-lhes a vida.

O pai da família, ao cair no chão com uma tremenda pancada que quase lhe partiu o crânio, ouviu uma voz di­zer-lhe: "Não temas! Teus irmãos estão orando por ti." Antes de ficar inconsciente, viu chegar a galope um cavalo que ameaçava atropelá-lo. Ao voltar a si, viu que o cavalo caíra ao seu lado, esperneando de tal maneira que os seus atacantes foram obrigados a desistirem do propósito de matar o missionário. Assim ele reconheceu que a mão de Deus o guardava maravilhosa e constantemente durante o tempo do morticínio dos boxers, no qual centenas de cren­tes foram mortos. Jônatas Goforth e sua família, foram sal-vos de inumeráveis situações angustiosas entre o povo amotinado, até que, por fim, vinte dias depois, chegaram ao litoral do país.

Rosalind e Jônatas Goforth tinham as suas vidas escon­didas com Cristo em Deus. Eis como viviam, nas suas pró­prias palavras: "Não é somente tolice aceitar para nós mesmos a glória que pertence a Deus, mas é grave pecado, porque o Senhor diz: 'A minha glória a outrem não darei'."

Quando ainda jovem, Jônatas Goforth adotou as pala­vras de Zacarias 4.6 como lema da sua vida: "Não por for­ça nem por violência, mas por meu espírito, diz o Senhor dos Exércitos."

Alguém que o conhecia intimamente escreveu: "Antes de tudo, Jônatas Goforth era um ganhador de almas. Foi por essa razão que se tornou missionário para o estrangei­ro; não havia outro interesse, outra atividade, outro minis­tério que o atraísse. Com o fogo do amor de Deus no cora­ção, ele manifestava um entusiasmo irresistível e uma energia incansável. Nada podia impedir os esforços dinâ­micos na obra, para a qual Deus o chamara. Era assim tan­to aos setenta e sete anos como quando tinha cinqüenta e sete. Com a perda da vista durante os últimos três anos da sua vida, não diminuíram seus esforços - parece que au­mentaram."

Revela-se, nas suas próprias palavras, como foram lan­çados os alicerces da sua vida constantemente esforçada no serviço do Senhor: "Minha mãe, quando eu e meus ir­mãos éramos ainda crianças, com desvelo incessante, nos ensinava as Escrituras e orava conosco. Uma coisa que teve grande influência sobre a minha vida foi o fato de mi­nha mãe me pedir que lesse os Salmos para ela em voz al­ta. Tinha apenas cinco anos, quando comecei a fazer esse exercício e achei a leitura fácil. Com a continuação, adqui­ri o costume de decorar as Escrituras, coisa que continuei a fazer com grande proveito".

Todos podemos testificar que é fácil fazer com que a leitura das Escrituras e a oração cheguem a uma monótona formalidade. Mas, ao contrário, o semblante de Jônatas Goforth se iluminava com o reflexo da glória das Escritu­ras que recebia na alma. Depois da sua morte, uma criada católica romana declarou: "Quando o senhor Goforth se hospedava na casa onde trabalho, eu mirava seu rosto e di­zia a mim mesma: O rosto de Deus pode ser assim!"

Acerca da conversão de seu pai, Jônatas escreveu: "No tempo da minha conversão, morava com meu irmão Gui­lherme. Certa vez, nossos pais nos visitaram, passando co­nosco mais ou menos um mês. Fazia tempo que o Senhor me dirigira a fazer culto doméstico. Assim, certo dia, anunciei: Taremos o culto doméstico de hoje e peço que todos se reúnam depois do jantar'. Esperava que meu pai se manifestasse contrariamente, porque em casa não cos­tumávamos dar graças antes das refeições, quanto mais fa­zer culto doméstico! Li um capítulo de Isaías e, depois de falar algumas palavras, oramos juntos, de joelhos. Conti­nuamos a realizar os cultos domésticos durante o tempo que eu estava em casa. Depois de alguns meses meu pai foi salvo."

O jovem Goforth, no tempo de estudante no ginásio, vi­sava a ser advogado, até que, certo dia, leu a inspiradora biografia do pregador Roberto McCheyne. Não somente se desvaneceram para sempre todas as suas visões de ambi­ção, mas ele dedicou, também, a sua própria vida a levar almas ao Salvador. Nesse tempo, "devorou" os livros: "Os Discursos de Spurgeon"; "Os Melhores Sermões de Spurgeon"; "Graça Abundante" (Bunyan); e "O Descanso dos Santos" (Baxter). A Bíblia, contudo, era o seu livro predi­leto, e costumava levantar-se duas horas mais cedo para estudar as Escrituras, antes de se ocupar em qualquer ou­tro serviço do dia.

Acerca da sua chamada, nesse tempo, ele escreveu: "Apesar de sentir-me dirigido ao ministério da Palavra, recu­sava terminantemente a ser missionário no estrangeiro. Mas um colega me convidou a assistir à reunião de um missionário, o qual fez o seguinte apelo: 'Faz dois anos que passo de cidade em cidade contando a situação de Formo­sa e rogando que algum jovem se ofereça para me auxiliar. Mas parece que não consegui transmitir a são a nenhum. Volto, então, sozinho. Dentro de pouco tempo meus ossos estarão enbranquecendo na encosta dum morro em Formosa. Quebranta-me o coração saber que nenhum moço se sente dirigido a continuar o trabalho que iniciei'.

"Ao ouvir essas palavras, senti-me vencido pela vergo­nha. Se o chão tivesse me engolido, teria sido um alívio. Eu, comprado com o precioso sangue de Cristo, ousava planejar a minha vida como eu mesmo queria. Ouvi a voz do Senhor dizer: 'A quem enviarei, e quem há de ir por nós?' E respondi: Eis-me aqui, envia-me a mim! Desde então sou missionário. Lia avidamente tudo que podia achar acerca de missões no estrangeiro e me esforçava por transmitir aos outros a visão que eu alcançara - a visão dos milhões da terra sem oportunidade de ouvirem um prega­dor".

Por fim chegou o tempo de iniciar seus estudos em To­ronto. O primeiro domingo ele o passou trabalhando entre os prisioneiros, na prisão "Don", um costume que conti­nuou durante todos os anos de estudos nessa cidade. Du­rante a semana, dedicava muito tempo a andar de casa em casa ganhando almas para Cristo. Quando o diretor do co­légio onde estudava perguntou-lhe quantas casas visitara durante os meses de junho a agosto, ele respondeu: "Novecentas e sessenta."

Foi nesse tempo dos estudos que Jônatas Goforth se ca­sou com Rosalind Bell-Smith. Acerca desse ato ela escre­veu:

"Comecei, aos vinte anos de idade, a orar pedindo que, se o Senhor desejasse que eu me casasse, Ele me dirigisse um moço inteiramente dedicado a Ele e ao seu serviço... Certo domingo, achei-me em uma reunião de obreiros da Toronto Mission Union. Um pouco antes de começar a reu­nião, alguém à porta chamou Jônatas Goforth. Ele, ao le­vantar-se para ir lá fora, deixou a Bíblia na cadeira. Então eu fiz uma coisa que nunca pude explicar, nem para ela achei desculpas; senti-me impelida a ir à cadeira dele, apanhei a Bíblia, e voltei à minha cadeira. Ao folhear rapi­damente o livro, achei-o quase gasto pelo uso, e marcado de capa a capa. Fechei-o, e sem demora, coloquei-o de novo na cadeira. Tudo isso aconteceu em um intervalo de poucos segundos. Ali, sentada no culto, eu disse a mim mesma: 'Esse é o moço com quem seria bom que eu me ca­sasse'.

"No mesmo dia fui apontada, juntamente com outras para abrir um ponto de pregação em outra parte de Toron­to. Jônatas Goforth estava também entre o grupo. Durante as semanas que se seguiram, eu tive muitas oportunidades de ver a verdadeira grandeza da alma desse homem, a qual nem seu exterior desprezível podia esconder. Assim, quan­do ele me perguntou: - 'Queres unir a tua vida à minha para irmos à China?' Sem vacilar um só momento, respon­di: - Quero! Mas, alguns dias depois, foi grande a minha surpresa quando ele me perguntou: - 'Prometes nunca me impedir de colocar o Senhor e a sua obra em primeiro lu­gar, mesmo antes de ti?' Era essa mesma a qualidade de moço que eu pedira, em oração, para que Deus mo desse como marido, e firmemente respondi: Prometo fazê-lo sempre! Oh! Como fora benigno o Mestre, ao esconder-me o que essa promessa significava!

"Poucos dias depois de eu haver prometido o que me pe­diu, veio a primeira prova. Eu sonhava, como mulher que era, com o bonito anel de casamento que ia receber. Foi en­tão que Jônatas me disse: - 'Não te importas se eu te não comprar uma aliança?' A seguir explicou com grande entu­siasmo, como se esforçava na distribuição de livros e folhe­tos sobre o trabalho na China. Queria economizar o mais possível para essa importante obra. Ao ouvi-lo, e depois de contemplar a luz no seu rosto, as visões de uma aliança bo­nita se desvaneceram: Era a minha primeira lição sobre os verdadeiros valores!"

Em 19 de janeiro de 1888, centenas de crentes se reuni­ram na estação em Toronto para se despedirem do casal Goforth que ia trabalhar na obra de Deus na China. Antes de sair o trem, todos baixaram a cabeça em oração e, ao partir o trem, a grande multidão cantava: "Avante, solda­dos de Cristo!" E, uma vez fora da estação, os dois no trem rogaram a Deus que os guardasse para viverem eternamen­te dignos da grande confiança que esses irmãos deposita­ram neles.

Não muito depois de chegarem à China, Hudson Tay­lor lhes escreveu: "Faz dez anos que a nossa missão se esforça para entrar no Sul da província e somente agora é que o conseguimos..." Se a China Inland Mission, com mis­sionários e auxiliares experientes na língua e nos costumes do povo sofre fracasso durante dez anos nessa província, como podia entrar ele, jovem inexperiente e sem conhecer a língua?! As palavras de Hudson Taylor, "avançar de joe­lhos", tornaram-se o lema da missão de Goforth para en­trar no Norte de Honã.

Jônatas Goforth levou mais tempo a aprender a língua, do que seu companheiro que chegara um ano depois dele. Certo dia, ao sair para pregar, ele, em grande desespero, disse à sua esposa: "Se o Senhor não operar um milagre para eu aprender essa língua, serei um grande fracasso como missionário!" Duas horas depois voltou, dizendo: "Oh! Rosa! Que maravilha! Ao começar a pregar, as pala­vras e as frases tornaram-se tão fáceis que o povo me com­preendeu bem." Dois meses depois receberam uma carta dos estudantes no colégio Knox, em Toronto, contando como em certo dia a certa hora eles se reuniram para orar por eles - "Somente pelos Goforth" - e ficaram convenci­dos de que eles foram abençoados por Deus, porque senti­ram muito a presença e o poder de Deus na oração. Goforth, ao abrir seu diário, descobriu que foi no mesmo dia e hora que Deus lhe deu a habilidade de falar fluentemente. Alguns anos depois, certo patrício seu, que falava bem o chinês, disse-lhe acerca do seu estilo de falar: "Compreen­de-se a fala do senhor sobre uma área maior do que de qualquer outra pessoa que conheço."

Um missionário veterano assim aconselhou a Goforth: "Os chineses têm tantos preconceitos do nome de Jesus que deve esforçar-se para demolir os deuses falsos e só de­pois mencionar o nome de Jesus, se houver oportunidade." Ao contar isso à sua esposa, Goforth exclamou indignado: "Nunca! Nunca! NUNCA!" Em nenhum tempo ele se le­vantou para pregar sem a Bíblia aberta na mão.

Quando, alguns anos depois, os missionários novatos lhe perguntaram o segredo do fruto extraordinário do seu ministério, ele respondeu: "Deixo Deus falar às almas dos ouvintes por intermédio da sua própria Palavra. Meu úni­co segredo para tocar no coração dos mais vis pecadores é mostrar-lhes a sua necessidade e pregar-lhes o Salvador poderoso para os salvar... Esse era o segredo de Lutero, era o segredo de João Wesley e ninguém se aproveitou mais dele do que D. L. Moody". Para manejar a ''Espada do Espírito" com grande execução, Goforth a "afiava", estudando-a diariamente, sem falhar. Em vez de falar contra os ídolos, ele exaltava a Cristo crucificado. Isso atraía os pecadores para deixarem as suas vaidades.

Em 1896, ele escreveu: "Depois de chegar a Changté, há cinco meses, o poder do Espírito Santo se manifesta quase diariamente para nos alegrar. Durante esses meses, um total de mais de 25.000 homens e mulheres nos visita­ram em casa, e todos ouviram a pregação do Evangelho. Pregamos, na média, oito horas por dia. Há, às vezes, mais de cinqüenta mulheres de uma vez no terraço. (Ele prega­va aos homens, enquanto a sua esposa pregava às mulhe­res.) Quase todas as vezes que apresentamos Cristo como Redentor e Salvador, o Espírito Santo salva alguém e, às vezes, dez a vinte."

Contudo, não se deve pensar que esses missionários es­caparam de grandes tribulações. Não muito depois de che­garem à China, um incêndio destruiu todas as suas posses­sões terrestres. O calor do verão era tão intenso que sua primogênita, Gertrude, faleceu e foi necessário levar o ca­dáver a uma distância de 75 quilômetros, a um lugar onde se permitia enterrar os estrangeiros. Quando faleceu outro filhinho, Donald, foi necessário fazer de novo a mesma lon­ga viagem de 75 quilômetros com os restos mortais. Depois de passarem doze anos na China, novamente perderam tudo quanto tinham em casa, quando as águas de uma en­chente subiram à altura de dois metros dentro da casa.

No ano 1900, logo após outra filha, Florença, morrer de meningite, veio a insurreição dos Boxers - acerca da qual já nos referimos. No levante dos Boxers, muitas centenas de missionários e crentes foram brutalmente mortos. Só a mão de Deus os guiou e os sustentou na fuga de Changté -uma viagem de 1.500 quilômetros, em tempo de intenso calor e de doença em um dos quatro filhos. Inúmeras vezes foram cercados pelas multidões que clamavam: "Matai-os! Matai-os!" Uma vez a multidão enfurecida arremessou pedras tão grandes que quebraram a espinha dos cavalos que puxavam a carroça, mas todas as pessoas do grupo es­caparam! Goforth levou vários golpes de espada, um dos quais atingiu o osso do braço esquerdo, quando o ergueu para defender a cabeça. Apesar de o grosso capacete, que tinha na cabeça, ficar quase inteiramente cortado em pe­daços, ele conseguiu manter-se em pé até que recebeu um golpe que, por pouco, não lhe partiu o crânio. Mas Deus não permitiu que a mão dos homens os destruíssem, por­que ainda tinha uma grande obra para fazer na China por intermédio desses servos. Assim, sem poderem cuidar das feridas e com as roupas ensangüentadas, o grupo enfrenta­va as multidões furiosas, dia após dia, até alcançar Shanghai. De lá, a família embarcou em um navio para o Canadá.

Logo que diminuiu o perigo na China, os nossos incan­sáveis heróis estavam novamente ocupados no trabalho em Changté. A região foi dividida em três: a parte que caiu em sorte a Goforth foi o vasto território ao norte da cidade com inúmeras vilas e povoados.

O plano de Goforth era alugar uma casa em um centro importante, passar um mês evangelizando e, depois mu­dar-se para outro centro. Queria que a sua esposa pregasse no pátio da casa, de dia, enquanto ele e seus auxiliares pre­gavam nas ruas e nos povoados ao redor. À noite, faziam os cultos juntos, ela tocando o harmonium. No fim do mês, podiam deixar um dos auxiliares para ensinar os novos convertidos, enquanto o grupo passava para outro centro. Acerca desse plano a esposa de Goforth escreveu:

"De fato, o plano foi bem concebido, a não ser uma coi­sa: não se lembrou das crianças... Lembrei-me de como os meninos com varíola, em Hopei, me cercaram quando se­gurava a criança no colo. Lembrei-me das quatro covas de nossos pequeninos, e endureci o coração, como pederneira, contra o plano. Como meu marido suplicava dia após dia! 'Rosa, por certo o plano é de Deus e receio o que possa acontecer aos filhos se desobedecermos. O lugar mais segu­ro para ti e os filhos é no caminho da obediência. Pensas em guardar os filhos seguros em casa, mas Deus pode mos­trar-te que não podes. Contudo, Ele guardará os filhos se obedeceres confiando nele!' Não muito depois, Wallace caiu doente de disenteria asiática e por quinze dias luta­mos para salvar a criança; meu marido me disse: 'Oh! Ro­sa, cede a Deus, antes de perder tudo.' Mas parecia-me que Jônatas era duro e cruel. Então nossa filha Constância caiu enferma da mesma doença. Deus revelou-se a mim como um Pai em quem eu podia confiar para conservar os meus filhos. Baixei a cabeça e disse: 'Ó Deus, é tarde de­mais para a Constância, mas confio em ti, guarda os meus filhos. Irei aonde quer que me mandes.' Na tarde do dia em que a criança faleceu, mandei chamar a senhora Wang, uma crente fervorosa e amada e lhe disse: 'Não posso con­tar-lhe tudo agora, mas estou resolvida a acompanhar meu marido nas viagens de evangelização. Quer ir comigo?' Com lágrimas nos olhos, ela respondeu: 'Não posso, pois a menina pode adoecer sob tais condições.' Não querendo in­sistir, pedi que ela orasse e me respondesse depois. No dia seguinte ela voltou com os olhos cheios de lágrimas e, com um sorriso, disse: 'Irei com vocês'."

É coisa notável que não faleceu mais nenhum filho dos Goforth, na China, apesar dos muitos anos que passaram na vida nômade de evangelização. Goforth observou tão fielmente seu costume de levantar-se às 5 horas para ora­ção e estudo das Escrituras, como quando estava em casa, em Chantgé. Geralmente, para o estudo tinha de ficar em pé diante da janela, com as costas viradas para a família. Acerca da obra em Chantgé, são de Goforth estas pa­lavras: "Nos primeiros anos de meu trabalho na China, contentava-me com a lembrança de que sempre há semen­teira antes da colheita. Mas já passavam mais de treze anos e a colheita parecia ainda distante. Tinha a certeza de que haveria uma coisa melhor para mim se eu tivesse a visão e a fé necessárias para adquiri-la. Estavam constan­temente perante mim as palavras do Mestre em João 14.12: 'Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço, e as fará maio­res do que estas; porque eu vou para meu Pai.' E sentia profundamente como no meu ministério faltavam as 'maiores obras'."

No ano de 1905, Jônatas Goforth leu na Autobiografia de Carlos Finney que um lavrador podia, com muita razão, orar pedindo uma colheita material independentemente de se cumprirem as leis da natureza, assim como os crentes podem esperar uma grande colheita de almas sem se cum­prirem as leis que governam a colheita espiritual. Resolveu então saber quais eram essas leis e decidiu-se a cumpri-las, a qualquer preço.

Fez um estudo a fundo e de joelhos, sobre o Espírito Santo e escreveu as notas nas margens da sua Bíblia chine­sa. Quando começou a ensinar essas lições aos crentes, houve grande quebrantamento, com confissão de pecados. Foi na grande exposição idólatra de Hsun Hsien que Deus primeiramente mostrou seu grande poder no ministério de Goforth. Durante o sermão, um obreiro exclamou em voz baixa: "Esse povo está tão comovido, pela pregação, como a multidão no dia de Pentecoste, pelo sermão de Pedro". Na noite do mesmo dia, num salão alugado e que não com­portava toda a grande multidão pagã que queria assistir, Goforth pregou sobre o texto: "Levando Ele em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro". Quase todos mostra­ram-se convictos do pecado e quando o pregador fez o ape­lo, levantaram-se clamando: "Queremos seguir a esse Je­sus que morreu por nós!" Um dos obreiros presentes assim expressou o que viu: "Irmão, aquele a quem oramos duran­te tanto tempo para que viesse, veio de fato esta noite." Nos dias que se seguiram, pecadores foram salvos em todos os pontos de pregação e em todos os cultos.

Acerca do avivamento, que nesse tempo visitou a Co­réia, um dos missionários escreveu sobre o que presenciou: "Os missionários eram como os demais crentes: não havia alguém entre eles de talento extraordinário. Viviam e tra­balhavam como quaisquer outros, a não ser nas orações... Nunca senti a presença divina como a senti nos seus rogos a Deus. Parecia que esses missionários nos levavam ao pró­prio trono no Céu! Fiquei muito impressionada, também, ao ver como o avivamento era prático... Havia dezenas de milhares de homens e mulheres transformados completa­mente pelo fogo divino. Grandes templos, com assentos para 1.500 pessoas, ficavam superlotados; era necessário realizar um culto para os homens e, em seguida, outro para as mulheres, a fim de que todos pudessem assistir. Em to­dos ardia o desejo de espalhar as 'boas-novas'. Crianças se aproximavam das pessoas que passavam pelas ruas, rogando-lhes que aceitassem a Cristo por seu Salvador... A pobreza do povo da Coréia era conhecida em todo o mun­do. Contudo, havia tanta liberalidade nas ofertas, que os missionários não queriam ensinar mais sobre o dever de contribuir. Havia grande dedicação à Bíblia, quase todos levando um exemplar no bolso. E o maravilhoso espírito de oração permeava tudo."

Ao voltar da Coréia, Goforth foi chamado a Manchúria. Mais tarde, ele escreveu: "Quando iniciei a longa viagem, estava convicto de que eu tinha uma mensagem de Deus para entregar àquele povo. Mas não tinha idéia de como presidir a um avivamento. Sabia pronunciar um discurso e sabia levar o povo a orar, porém nada mais sabia do que isso..."

Goforth teve um grande desapontamento ao chegar à Manchúria: os crentes não oravam como lhe prometeram fazer e a igreja estava dividida! Depois do primeiro culto, ele, sozinho no seu quarto, caiu de joelhos em desespero. E Deus respondeu à sua insistência, enviando tão grande de­sejo de oração nas igrejas e tão profunda contrição pelo pe­cado, que elas não somente foram purificadas de toda a classe de pecado, inclusive dos mais horrendos crimes, mas os perdidos, em grande número, vinham e eram salvos.

A senha do avivamento do ano de 1859 foi: "Necessário vos é nascer de novo" e a de 1870: "Crê no Senhor Jesus!" Mas a meta de Goforth foi: "Não por força, nem por vio­lência, mas por meu Espírito" (Zc 4.6). Que o Espírito Santo operava em vários lugares na Manchúria, em res­posta às orações insistentes e em face de embaraços de toda a sorte, vê-se claramente no que ele escreveu acerca da obra na cidade de Newchang:

"Ao subir ao púlpito, ajoelhei-me um momento, como de costume, para orar. Quando olhei para o auditório, pa­recia como que todos os homens, mulheres e crianças na igreja estivessem com dores de julgamento. As lágrimas corriam copiosamente e houve confissão de toda a espécie de pecado. Como se explica isso? A igreja era conhecida como igreja morta e sem mais esperança, contudo, antes de enunciar sequer uma palavra, sem mesmo cantar um hino e antes de orar, começou essa obra maravilhosa. Não há outra explicação: foi o Espírito de Deus, que operou em resposta às orações das igrejas de Mukden, Liaoyang e de outros lugares na Manchúria, as quais haviam experimen­tado a mesma qualidade de avivamento e foram induzidas a interceder por sua pobre e necessitada igreja irmã".

Jônatas Goforth, quando foi à Manchúria, era quase desconhecido fora do pequeno círculo da sua denominação. Depois de algumas semanas, quando voltou, os olhos dos crentes de todo o mundo estavam fitos nele. Contudo, per­maneceu o mesmo humilde servo de Deus, reconhecendo que a obra não era dele mas do Espírito de Deus.

Chansi é conhecida como "a província dos mártires". Certo chinês douto contou a Goforth como presenciara nes­sa província, durante a Insurreição dos Boxers, em 1900, de uma só vez a morte de 59 missionários. Todos eles enca­raram o carrasco com a maior calma. Uma mocinha, de ca­belos louros, perguntou ao governador: "Por que devemos morrer? Os nossos médicos não vieram de países remotos para dar suas vidas para servir ao seu povo? Muitos doen­tes sem esperança não foram curados? Diversos cegos não receberam a vista? É por causa do bem que fizemos que devemos morrer?" O governador baixou a cabeça, e não respondeu. Mas um soldado, pegou a mocinha pelos cabe­los, e com um só golpe, decepou-lhe a cabeça. Um após ou­tro foram mortos; todos morreram com um sorriso de paz. Esse mesmo chinês contou como viu, entre eles, uma se­nhora falando alegremente ao filhinho. Com um só golpe ela foi prostrada, mas a criança continuou a segurar-lhe a mão; logo a seguir outro golpe, um pequeno cadáver jazia ao lado do cadáver da mãe.

Foi a essa mesma "província dos mártires" que Deus enviou seus servos, os Goforth, oito anos depois, e aconte­ceu o que vamos ler: "Em Chuwahsien, não muito depois de começar a falar, vi muitos dos ouvintes baixarem a ca­beça, convictos, enquanto as lágrimas corriam-lhes pelas faces. Depois do discurso, todos que experimentaram orar, estavam quebrantados. O avivamento, que começou assim, continuou durante quatro dias. Houve confissão de toda a qualidade de pecados. O delegado regional se admi­rou grandemente ao ouvir confissões de homicídios, de rou­bos e de crimes de toda a sorte - confissões que ele só con­seguiria arrancar deles açoitando-os até quase os deixar mortos. Às vezes, depois de um culto de três horas, ou mais, o povo voltava a casa para continuar a orar. Mesmo em horas tardias da noite, havia pequenos grupos reunidos em vários lugares para orarem até quase clarear o dia".

No colégio de moças, em Chuwu, na mesma "província dos mártires", "as alunas insistiram para que lhes conce­dessem tempo para jejuar e orar... No dia seguinte, quando as moças se reuniram de manhã, para oração, o Espírito caiu sobre elas e ficaram de joelhos até a tarde desse dia."

Das centenas de exemplos evidentes da operação pode­rosa do Espírito Santo nos corações, dentre muitos outros lugares, citaremos aqui apenas os seguintes:

Changté: "Quase setecentas pessoas assistiram pela manhã. Havia um ferver de homens se esforçando para ir à frente, de modo que Goforth só conseguiu pregar à tarde. O culto era contínuo, prolongava-se o dia inteiro, com inter­valos para as refeições."

Kwangchow: "A igreja, com assentos para 1.400 ouvin­tes, não comportava as multidões. O Espírito Santo veio com poder extraordinário. Havia, às vezes, centenas de pe­cadores contritos chorando..." Dois endemoninhados fo­ram libertos e se tornaram crentes fervorosos na obra de Deus. Em quatro anos o número dos salvos aumentou de 2.000 para 8.000.

Shuntehfu: "Inesperadamente, uma dúzia de homens começaram a orar e a chorar... sem poderem resistir ao po­der do Espírito Santo... Velhos discípulos de Confúcio, vi­nham à frente, quebrantados e humilhados, para confessa­rem a Cristo como seu Senhor. Um total de quinhentos ho­mens e mulheres foram salvos. Foi, talvez, a maior obra do Espírito Santo que eu tinha visto."

Nanquim: "Assistiram mais de 1.500 pessoas. Cente­nas que também queriam assistir, não puderam entrar e voltaram a casa. O culto da manhã durou quatro horas. O resto do tempo foi dedicado à oração e confissão de pecados. A massa de pessoas que desejava chegar ao estrado para confessar seus pecados foi tão grande que se tornou necessário construir outra escada... Subi de novo ao estra­do, às 3 horas da tarde, para iniciar o segundo culto. Cen­tenas de pessoas, nesse momento, começaram a vir à fren­te e por isso eu não podia pregar... Às nove horas da noite, seis horas depois de iniciar o culto, fui obrigado a me reti­rar e embarcar para Pequim onde os crentes me esperavam para outra série de cultos."

Shantung: "O avivamento foi tão grande que cerca de 3.000 membros foram acrescentados à igreja em três anos."

Acerca dos cultos entre os soldados do general Feng, a esposa de Goforth escreveu: ''Desde o início, sentimos a presença de Deus. Duas vezes, todos os dias, Goforth tinha auditórios de cerca de 2.000 pessoas, principalmente ofi­ciais, que se mostravam grandemente interessados... A três cultos, às esposas foi permitido assistirem, e Deus me deu poder para falar-lhes. Quase todas declararam-se prontas a seguir a Cristo. O general Feng, ao experimentar orar, ficou quebrantado... A seguir outros oficiais, um após outro, começaram a clamar a Deus entre soluços e lágrimas."

Assim continuou a obra, ano após ano, geralmente com três cultos por dia, apesar de grandes obstáculos. No perío­do da seca de 1920, 30 a 40 milhões dos habitantes ao redor encararam a morte pela fome. Em 1924, Goforth assim es­creveu à sua esposa, forçada por doença a voltar ao Cana­dá: "Completo hoje 65 anos... Oh! Como cobiço, mais que qualquer avarento cobiça o ouro, vinte anos ainda para ga­nhar almas!"

Depois de completar 68 anos de idade e sua esposa 62, idades em que a maioria dos homens se afastam do serviço ativo, os dois foram enviados para um campo inteiramente novo, na Manchúria - campo distante, vasto e frio, que se estende até as fronteiras da Rússia e da Mongólia. Acerca da sua partida, Goforth escreveu:

"Certo dia, em fevereiro de 1926, a minha esposa esta­va deitada esperando a chegada da assistência para levá-la ao Hospital Geral de Toronto. De repente, a campainha da porta e a do telefone tocaram simultaneamente. Pelo tele­fone fomos avisados de que não haveria lugar no hospital antes de três dias. Na porta recebemos um cabograma do general Feng, da China, rogando que eu fosse sem demora. Nesse momento eu disse à minha esposa: 'Que farei? Não posso deixar-te'. (Todos pensávamos que ela não viveria muitos meses mais.) Minha esposa, depois de orar, disse: 'Vou contigo.' Os membros da junta estavam reunidos na ocasião; apresentei-lhes o cabograma do general Feng e concordaram que eu fosse. Mas quando os informaram de que a minha esposa queria acompanhar-me, mostraram-se horrorizados, respondendo que ela morreria no caminho. Então eu lhes disse: 'Os irmãos não conhecem essa mulher como eu. Quando ela diz que vai, ela vai!' Assim concorda­ram em que ela fosse."

Durante muito tempo, avisados pelo cônsul do novo campo da Manchúria, viviam com as malas arrumadas, a fim de partirem imediatamente no caso de haver uma se­gunda insurreição dos Boxers, como todos esperavam. Contudo, desde o início, Deus honrou o serviço desses ser­vos, conforme se lê no que ele escreveu na avançada idade de 70 anos: "Realizavam-se três horas de pregação de ma­nhã pelo grupo de missionários e quatro horas à tarde... Desde o primeiro dia houve conversões; às vezes doze em um só dia. Grande foi o nosso gozo ao vermos cerca de duzentas pessoas aceitaram a Cristo durante o mês de maio."

Havia muito tempo que diversos amigos insistiam em que ele escrevesse a história de como o Espírito Santo ope­rava no seu ministério. Em tempo de intenso frio, viu-se obrigado a extrair os dentes; durante quatro longos meses sofreu dores cruciantes nos maxilares, a ponto de não po­der pregar. Foi nessa época que seu filho menor chegou do Canadá. Goforth então conseguiu ditar a matéria para o fi­lho datilografar. Dessa forma foi impresso o livro "Por Meu Espírito", obra de grande circulação e influência.

Após quatro anos de serviço, foi-lhe necessário voltar ao Canadá, por causa da vista de sua esposa. Foi durante esse tempo que Goforth, também, começou a perder a vista. Enquanto convalescia das operações mal-sucedidas para restaurar-lhe a visão de um olho. Ele relatou, uma por uma, as histórias da obra na China, histórias que a sua en­fermeira estenografou e que, agora, completam o famoso livro intitulado: "Vidas Milagrosas da China".

Em 1931, Goforth e sua esposa, ela com 67 anos e ele com 72, com os corações ardendo pelo desejo de ganhar al­mas, voltaram mais uma vez à obra na Manchúria. Qua­trocentos e setenta e dois convertidos foram batizados em 1932. Um dia Goforth voltou de uma viagem evangelística para entrar em casa às apalpadelas. Depois de ficar um momento ao lado da sua esposa, ele lhe disse em voz baixa: "Receio que a retina do olho esquerdo tenha saído do lu­gar." E assim tinha acontecido. A perda completa da visão era para ele uma tristeza, uma tragédia, sentida por todos. Ao mesmo tempo chegou-lhes uma carta informando-os de uma redução tão grande no que recebiam para o sustento dos missionários e nas despesas das viagens evangelísticas, que parecia impossível continuar a obra. Foi a maior crise de toda a vida de Jônatas Goforth. Contudo, sem vacilar, olhou para Deus. A própria cegueira parecia mais uma bênção do que uma aflição: os crentes mostravam-se mais ligados a ele do que antes. Vencendo o desânimo inevitável dos que perdem a vista, não cessou de pregar com a Bíblia que amava, aberta nas mãos. No ano de 1933, setecentos e setenta e oito convertidos foram batizados.

Por fim, os Goforth cederam ao apelo dos crentes do Canadá a que voltassem para animar as igrejas a enviarem mais missionários. Durante os preparativos para a viagem, souberam que novecentos e sessenta e seis convertidos fo­ram batizados naquele ano, 1934. O culto de despedida foi um dos mais comoventes em toda a história da obra mis­sionária. O missionário, tão amado pelos crentes, agora, por causa da cegueira, não podia ver como tinham enfeita­do o templo, mas eles bondosamente e com prazer lhe des­creveram tudo acerca das muitas e lindas bandeiras de seda e veludo que cobriam inteiramente as quatro paredes do templo. Os pregadores que falaram, o fizeram choran­do. Um deles disse: "Agora Elias está para sair de nosso meio e cada um de nós deve tornar-se um Eliseu".

Na hora da despedida, na plataforma da estação estava uma multidão de crentes chorando. Goforth, sentado diante da janela no trem, com o rosto virado para aqueles cren­tes que tanto amava, mas não podia ver, continuava a fazer-lhes sinais com a cabeça, de vez em quando, levantan­do os olhos para cima, indicando, assim, a bendita espe­rança de uma reunião no Céu. Quando o trem partiu, os crentes com os olhos cheios de lágrimas, tentaram acom­panhá-lo, correndo paralelamente, a fim de conseguirem olhar mais uma vez para o rosto desses queridos missioná­rios.

Durante dezoito meses, Goforth pregou a grandes audi­tórios no Canadá e nos Estados Unidos. Dia após dia, esse veterano estava em pé diante desses auditórios, com a sua amada Bíblia aberta nas mãos. Abria o livro, aproximada­mente nas páginas, das quais citava as passagens de cor, durante o sermão. Isso ele fazia, tendo os olhos abertos e com tanta prática, que era difícil crer que as não lia como outrora.

O ponto principal de suas mensagens descobre-se nes­tas palavras que ele disse certo dia à sua esposa: "Querida, acabo de fazer um cálculo mental que prova com certeza qual o resultado de dar ao Evangelho a oportunidade de operar. Se cada um dos missionários enviados à China ti­vesse levado tantas almas a Jesus como os seis missioná­rios do nosso campo durante o ano de 1934, o último ano que passamos na Manchúria, isto é, 166 por cada missio­nário, o número de conversões na China teria alcançado a cifra de quase um milhão de almas, em vez de apenas 38.724, isto é, teria sido vinte e cinco vezes maior!"

Certo dia, quando tinha de pregar somente à noite, ele disse á sua esposa: "Em vez de sairmos de casa hoje, acho melhor participarmos de um banquete da Palavra. Lê para mim o precioso Evangelho de João". Ela leu dezesseis capítulos desse livro. "Percebia-se que era um verdadeiro banquete para ele, pela atenção que prestava à leitura de certas passagens." Antes de falecer, tinha lido a Bíblia, de capa a capa, mais de setenta e três vezes.

Na noite do dia 7 de outubro de 1936, Jônatas Goforth, depois de um discurso fervoroso e longo, sobre o tema: "Como o Fogo do Espírito Varreu a Coréia", deitou-se tar­de para dormir. Às sete horas da manhã seguinte, a sua esposa levantou-se e vestiu-se. Logo a seguir verificou que foi mais ou menos no momento em que ela se levantou que ele, "dormindo aqui na terra, num instante, acordou-se na Glória, vendo de novo." Poucos dias antes, ele tinha dito que se regozijava em saber que o primeiro rosto que ia ver, seria o de seu Salvador.

Cinco anos e meio depois de Jônatas Goforth haver dor­mido no Senhor, Rosalind Goforth reuniu-se ao seu amado marido e companheiro de lutas. As últimas palavras que pronunciou, foram estas: "O Rei me chama. Estou pron­ta".

Dela também pode-se dizer, como foi dito a respeito de­le: "Entregava-se à oração e ao estudo da Palavra, para sa­ber a vontade de Deus. Foi esse amor pela leitura da Bíblia e a ininterrupta comunhão com Deus que lhe deram o po­der de comover auditórios e convencê-los do pecado e da necessidade do arrependimento. Em todas as ocasiões ele dominava a sua própria pessoa e confiava inteiramente no poder do Espírito Santo para descobrir as coisas de Jesus aos ouvintes."

Que o mesmo brado de guerra seja sempre nosso: "Não por força, nem por violência, mas por meu Espírito" - "Mas recebereis poder ao descer sobre vós o Espírito San­to".

(extraido do livro hérois da fé)

Hudson Taylor / O pai das missões no interior da China

Hudson Taylor / O pai das missões no interior da China


(1832-1905)


Tiago Taylor tinha-se levantado cedo de madrugada. Chegara por fim o auspicioso e anunciado dia de seu casa­mento; o moço ocupava-se em arrumar tudo para receber a noiva na casa que iam ocupar. Enquanto trabalhava, esta­va meditando sobre as ocorrências recentes na aldeola.

Duas famílias, a dos Cooper e a dos Shaw, converte­ram-se e convidaram João Wesley a pregar na feira. O ve­lho discursou sobre "a ira vindoura" de tal maneira, que o povo desistiu da amarga perseguição, deixando o intrépido pregador hospedar-se na casa do senhor Shaw.

Enquanto Tiago preparava a casa para a chegada da noiva, ouvia-se a voz da vizinha, a senhora Shaw, cantan­do. Lembrou-se de como ela, meses antes, passava todo o tempo acamada, gemendo dia após dia por causa do reu­matismo que a deixara aleijada. Mas quando "confiou no Senhor", como disse, para a cura imediata, grande foi a transformação. E indizível foi a surpresa do marido ao vol­tar a casa: a esposa não somente estava curada e de pé, mas estava varrendo a cozinha!Tiago Taylor odiava a religião. Ainda mais: esse era o dia em que se ia casar. Depois do casamento iam dançar e beber como se fazia em tais ocasiões. Mas não podia livrar-se das palavras, talvez ouvidas do sermão do pregador: "Porém eu e a minha casa serviremos ao Senhor."

Sim, ia ter uma esposa e assumir as responsabilidades de marido e de pai de família. Grande tinha sido seu des­cuido. Resolvido, então, a entrar seriamente na vida de ca­sado, começou a repetir as palavras: "Serviremos ao Se­nhor!"

As horas se passavam. O sol subia mais e mais sobre as casas cobertas de neve. Mas o jovem Tiago, esquecido de tudo que é material, e tomado pela realidade das coisas eternas, permaneceu de joelhos, face a face com Deus. O amor do Salvador, por fim, venceu o seu coração e Tiago Taylor levantou-se com a alma cheia do Senhor Jesus.

Podemos imaginar como os sinos dobraram, como a noiva e os convivas se impacientaram, nesse dia. Já havia passado a hora para o culto de casamento quando o jovem despertou do enlevo com Deus e se levantou da oração. De­pois de vestir-se, venceu rapidamente os três quilômetros até o vilarejo de Royston.

Sem perderem tempo em perguntar ao rapaz a razão de tanto atraso, realizou-se o culto, e Tiago e Elisabete saí­ram da igreja, casados. O jovem não vacilou, mas ao sair contou tudo acerca da sua conversão, ao ouvido de Bete. Ao ouvir o que ele relatava, ela exclamou em tom de deses­pero: "Casei-me, então, com um desses metodistas!"

Não houve dança nesse dia; a voz e o violino do noivo foram usados para glorificar o Mestre. Bete, apesar de sa­ber em seu coração que Tiago tinha razão, continuou a re­sistir e a queixar-se dia após dia. Então, certo dia, quando se mostrava ainda mais contrariada, o robusto Tiago le­vantou-a nos braços e a levou para o quarto, onde se ajoe­lhou ao seu lado, derramando a sua alma em oração por ela. Comovida pela profundeza da mágoa e cuidado que Tiago sentia por sua alma, ela começou a sentir também seu pecado e, no dia seguinte, de joelhos, ao lado do mari­do, Elisabete Taylor clamou a Deus, renunciando a vaida­de do mundo e entregando-se a Cristo.É, assim, com os bisavós, que começa a verdadeira bio­grafia do herói da fé, Hudson Taylor. Os avós e os pais, na mesma ordem, criaram seus filhos no mesmo temor de Deus.

Num memorável dia, antes do nascimento de Hudson, o primogênito da família, o pai procurou a sua esposa para conversar sobre uma passagem das Escrituras que o im­pressionava profundamente. Na sua Bíblia leu para ela uma parte dos capítulos 13 de Êxodo e 3 de Números: "Santifica-me todo o primogênito... Todo o primogênito meu é... Meus serão... Apartarás para o Senhor..."

Os dois conversaram muito tempo sobre o gozo que es­peravam ter. Então, de joelhos, entregaram seu primogêni­to ao Senhor, pedindo que desde já ele o separasse para a sua obra.

Tiago Taylor, o pai de Hudson, não somente orava fer­vorosamente por seus cinco filhos, mas ensinou-os a pedi­rem detalhadamente a Deus todas as coisas. Ajoelhados, diariamente, ao lado da cama, o pai colocava o braço ao re­dor de cada um enquanto orava insistentemente por ele. Desejava que cada membro da família passasse, também, ao menos meia hora, todos os dias, perante Deus, renovan­do a alma por meio de oração e estudo das Escrituras.

A porta fechada do quarto da sua mãe, diariamente ao meio-dia, apesar das suas constantes e inumeráveis obri­gações, tinha também grande influência sobre todos, pois sabiam que ela, assim, se prostrava perante Deus para re­novar suas forças e para que o próximo se sentisse atraído ao Amigo invisível que habitava nela.

Não é de admirar, portanto, que, ao crescer, Hudson se consagrasse inteiramente a Deus. O grande segredo do seu incrível êxito é que em tudo que carecia, no sentido espiri­tual ou material, recorria a Deus e recebia dos tesouros in­finitos.

Contudo, não devemos julgar que a mocidade de Hud­son Taylor fosse isenta de grandes lutas. Como acontece com muitos, o moço chegou à idade de dezessete anos sem reconhecer Cristo como seu Salvador. Acerca disso ele es­creveu mais tarde:"Pode ser coisa estranha, mas sou grato pelo tempo que passei no ceticismo. O absurdo de crentes que professam crer na Bíblia enquanto se comportam justamente como se não existisse tal livro, era um dos maiores argumentos dos meus companheiros céticos. Freqüentemente afirmava que, se eu aceitasse a Bíblia, ao menos faria tudo para se­guir o que ela ensina e no caso de achar que tal coisa não era prática, lançaria tudo fora. Foi essa a minha resolução quando o Senhor me salvou. Acho que desde então real­mente provei a Palavra de Deus. Certamente nunca me ar­rependi de confiar nas suas promessas ou de seguir a sua direção.

"Quero relatar então como Deus respondeu às orações da minha mãe e da minha querida irmã, por minha con­versão:

"Certo dia, para mim inesquecível,... para me divertir, escolhi um tratado na biblioteca de meu pai. Pensei em ler o começo da história e não ler a exortação do fim.

"Eu não sabia o que acontecia ao mesmo tempo no co­ração da minha querida mãe, que estava a mais de cem quilômetros de casa. Ela levantara-se da mesa anelando a salvação de seu filho. Estando longe da família e livre da lida doméstica, entrou no seu quarto, resolvida a não sair antes de receber a resposta às suas orações. Orou hora após hora, até que, por fim, só podia louvar a Deus: o Espírito Santo revelou-lhe que o filho por quem orava já se havia convertido.

"Eu, como já mencionei, fui dirigido ao mesmo tempo a ler o tratado. Fui atraído pelas palavras: A obra consuma­da. Perguntei-me a mim mesmo: "Por. que o escritor não escreveu: A obra propiciatória? Qual é a obra consuma­da?" Então vi que a propiciação de Cristo era plena e per­feita. Toda a dívida de nossos pecados ficou paga e não res­tava coisa alguma que eu fizesse. Então raiou em mim a gloriosa convicção; fui iluminado pelo Espírito Santo, para reconhecer que eu somente precisava de prostrar-me e, aceitando o Salvador e a sua salvação, louvá-lo para todo o sempre.

"Assim, enquanto a minha querida mãe, no seu quarto, de joelhos, estava louvando a Deus, eu também louvava a Deus na biblioteca de meu pai, onde entrara para ler o li­vrinho."

Foi assim que Hudson Taylor aceitou, para a sua pró­pria vida, a obra propiciatória de Cristo, um ato que trans­formou todo o resto da sua vida. Acerca da sua consagra­ção, ele escreveu:

"Lembro-me bem da ocasião, quando, com gozo no co­ração, derramei a alma perante Deus, repentinamente, confessando-me grato e cheio de amor porque Ele tinha feito tudo - salvando-me quando eu não tinha mais espe­rança, nem queria a salvação. Supliquei-lhe que me conce­desse uma obra para fazer, como expressão do meu amor e gratidão, algo que envolvesse abnegação, fosse o que fosse; algo para agradar a quem fizera tanto para mim. Lembro-me de como, sem reserva, consagrei tudo, colocando a mi­nha própria pessoa, a minha vida, os amigos, tudo sobre o altar. Com a certeza de que a oferta fora aceita, a presença de Deus se tornou verdadeiramente real e preciosa. Pros­trei-me em terra perante Ele, humilhado e cheio de indizí­vel gozo. Para que serviço fora aceito eu não sabia. Mas fui possuído de uma certeza tão profunda de não pertencer mais a mim mesmo, que esse entendimento, depois domi­nou toda a minha vida".

O moço que entrou no quarto para estar sozinho com Deus nesse dia, não era o mesmo quando dali saiu. Um alvo e um poder se apossaram dele. Não mais ficou satis­feito em somente alimentar a sua própria alma nos cultos; começou a sentir a sua responsabilidade para com o próxi­mo - anelava tratar dos negócios de seu Pai. Regozijava-se com riquezas e bênçãos indizíveis. E, como os leprosos no arraial dos siros, Hudson e sua irmã, Amélia, diziam: Não fazemos bem; este dia é de boas novas, e nos calamos. De­sistiram, pois, de assistir aos cultos aos domingos à noite e saíram para anunciar a mensagem, de casa em casa, entre as classes mais pobres da cidade. Mas Hudson Taylor não se sentia satisfeito; sabia que ainda não estava no centro da vontade de Deus. Na angústia de seu espírito, como aquele da antiguidade, clamou: Não te deixarei ir, se me não abençoares. Então, sozinho e de joelhos, surgiu na sua alma um grande propósito: se Deus rompesse o poder do pecado e o salvasse em espírito, alma e corpo para toda a eternidade, ele renunciaria tudo na terra para ficar sempre ao seu dispor. Acerca desta experiência, foi ele mesmo que se expressou:

"Nunca me esquecerei do que senti então; não há pala­vras para descrever. Senti-me na presença de Deus, en­trando numa aliança com o Todo-poderoso. Pareceu-me que ouvi enunciadas as palavras: Tua oração é ouvida; to­das condições são aceitas.' Desde então nunca duvidei da convicção de que Deus me chamava a trabalhar na China."

A chamada de Deus, apesar de Hudson Taylor quase nunca a mencionar, ardia como um fogo dentro do seu co­ração. Copiamos a seguir o seguinte trecho de uma das car­tas enviada a sua irmã:

"Imagina, centenas de milhões de almas sem Deus, sem esperança, na China! Parece incrível; milhões de pes­soas morrem dentro de um ano sem qualquer conforto do Evangelho!... Quase ninguém liga importância à China, onde habita cerca da quarta parte da raça humana... Ora por mim, querida Amélia, pedindo ao Senhor que me dê mais da mente de Cristo... Eu oro no armazém, na estreba­ria, em qualquer canto onde posso estar sozinho com Deus. E ele me concede tempos gloriosos... Não é justo esperar que V... (a noiva de Hudson) vá comigo para morrer no es­trangeiro. Sinto profundamente deixá-la, mas meu Pai sabe qual é a melhor coisa e não me negará coisa alguma que seja boa..."

A falta de espaço não permite relatarmos aqui o heroís­mo da fé que o jovem mostrou suportando os sacrifícios e as privações necessárias para cursar a escola de medicina e de cirurgia para melhor servir o povo da China.

Antes de embarcar, escreveu estas palavras à sua mãe: "Anelo estar aí uma vez mais e sei que a senhora quer ver­me, mas acho melhor não nos abraçarmos um ao outro mais, pois isso seria encontrarmo-nos para logo nos sepa­rarmos para todo o sempre..." Contudo a sua mãe foi ao porto de onde o navio se ia fazer à vela. Alguns anos depois ele assim registrou a partida:"A minha querida mãe, que agora está com Cristo, veio a Liverpool para despedir-se de mim. Nunca me esquece­rei de como ela entrou comigo no camarote em que eu ia morar quase seis longos meses. Com o carinho de mãe, en­direitou os cobertores da pequena cama. Assentou-se ao meu lado e cantamos o último hino antes de nos separar­mos um do outro. Ajoelhamo-nos e ela orou. Foi a última oração de minha mãe antes de eu partir para a China. Ou­viu-se então o sinal para que todos os que não eram passa­geiros saíssem do navio. Despedimo-nos um do outro, sem a esperança de nos encontrarmos outra vez... Ao passar o navio pelas comportas, e quando a separação começou a ser realidade, do seu coração saiu um grito de angústia tão comovente, que jamais esquecerei. Foi como que meu cora­ção fosse traspassado por uma faca. Nunca reconheci tão plenamente até então, o que significam as palavras: Pois assim amou Deus ao mundo. Estou certo de que a minha preciosa mãe, nessa ocasião, chegou a compreender mais do amor de Deus para com um mundo que perece do que em qualquer outro tempo da sua vida. Oh! como se entris­tece o coração de Deus ao ver como seus filhos fecham os ouvidos à chamada divina para salvar o mundo pelo qual seu amado, seu único Filho sofreu e morreu!"

Os passageiros de navios modernos conhecem muito pouco do incômodo de viajar em navio à vela. Depois de uma das muitas tempestades por que passou o "Dum­fries", o nosso herói escreveu: "A maior parte do que pos­suo está molhado. O camarote do comissário, coitado, inundou-se..." Somente pelas orações e grandes esforços de todos a bordo é que conseguiram salvar as próprias vi­das quando o navio, levado por grande temporal, estava prestes a naufragar nas pedras da praia de Gales. A viagem que esperavam realizar em quarenta dias levou cinco me­ses e meio! Somente em 1 de março de 1854, Hudson Taylor, com a idade de vinte e um anos, conseguiu desembar­car em Shanghai, quando então ele escreveu estas impres­sões:

"Não posso descrever o que senti ao pisar em terra. Pa­recia-me que o coração ia estourar; as lágrimas de gratidão e gozo corriam-me pelas faces."Sobreveio-lhe, então, uma grande onda de saudade; não havia amigos, nem conhecidos, nem qualquer pessoa em todo o país para saudá-lo bem-vindo nem mesmo al­guém que conhecesse o seu nome.

Nesse tempo a China era terra incógnita, a não ser os cinco portos no litoral, abertos à residência de estrangei­ros. Foi na casa de um missionário em Shanghai, um dos cinco portos, que o moço achou hospedagem.

A vitória em todas as variadas provações nesse tempo era devida à característica mais saliente de Hudson Tay­lor, talvez a de nunca ficar parado na sua obra, fosse qual fosse o contratempo.

Durante os primeiros três meses na China, distribuiu 1.800 Novos Testamentos e Evangelhos e mais de 2 mil li­vros. Durante o ano de 1855, fez oito viagens - uma de tre­zentos quilômetros, subindo o rio Yangtzé. Em outra via­gem visitou cinqüenta e uma cidades onde nunca antes se ouvira a mensagem do Evangelho. Nessas viagens foi sem­pre prevenido do perigo que corria a sua vida entre um povo que nunca tinha visto estrangeiros.

Para ganhar mais almas para Cristo, apesar da censura dos demais missionários, adotou o hábito de vestir-se como os chineses. Rapou a cabeça na frente, deixando o resto dos cabelos a formar trança comprida. A calça, que tinha mais de meio metro de folga, ele a segurava conforme o costume, com um cinto. As meias eram de chita branca, o calçado de cetim. O manto pendendo dos ombros, sobressaía-lhe a ponta dos dedos das mãos mais que setenta centímetros.

Mas uma das cruzes mais pesadas que o nosso herói teve de levar foi a falta de dinheiro, quando a missão que o enviara se achava sem recursos.

Em 20 de janeiro de 1858, Hudson Taylor casou-se com Maria Dyer, uma missionária de talento na China. Desse enlace nasceram cinco filhos. A casa em que moraram pri­meiro, na cidade de Ningpo, tornou-se depois o berço da famosa Missão do Interior da China.

As privações e os encargos de serviço em Shanghai, Ningpo e outros lugares eram tais que Hudson Taylor, an­tes de completar seis anos na China, foi obrigado a voltar à Inglaterra para recuperar a saúde. Foi para ele quase como que uma sentença de morte quando os médicos informa­ram-lhe de que nunca mais devia voltar à China.

Entretanto, o fato de perecerem mais de um milhão de almas todos os meses na China era uma realidade para Hudson Taylor; com seu espírito indômito, ao chegar à In­glaterra, iniciou imediatamente a tarefa de preparar um hinário e a revisão do Novo Testamento para os novos con­vertidos que deixara na China. Usando ainda o traje de chinês, trabalhava tendo o mapa da China na parede e a Bíblia sempre aberta sobre a mesa. Depois de alimentar-se e fartar-se da Palavra de Deus, fitava o mapa, lembrando-se dos que não tinham tais riquezas. Todos os problemas ele os levava a Deus; não havia coisa alguma demasiado grande, nem tão insignificante, que a não deixasse com o Senhor em oração.

Em razão de suas atividades, estava tão sobrecarrega­do de correspondência e nos trabalhos dos cultos em prol da China, que após a sua chegada passaram-se mais de vinte dias antes de conseguir abraçar seus queridos pais em Bransley.

Passava, às vezes, a manhã, outras vezes a tarde, em jejum e oração. O seguinte trecho que ele escreveu mostra como a sua alma continuou a arder nos seus discursos nas igrejas da Inglaterra, sobre a obra missionária.

"Havia a bordo, entre os companheiros de viagem, cer­to chinês que se chamava Pedro. Passara alguns anos na Inglaterra, mas, apesar de conhecer algo do Evangelho, não reconhecia coisa alguma do seu poder para salvar. Senti-me ligado a ele e esforcei-me em orar e falar para levá-lo a Cristo. Mas quando o navio se aproximava de Sung-Kiang e eu me preparava para ir a terra, pregar e distribuir trata­dos, ouvi o grito de um homem que caíra na água. Fui ao convés com os outros - Pedro tinha desaparecido.

"Imediatamente arriamos as velas, mas a correnteza da maré era tal que não tínhamos a certeza do lugar onde o homem caíra. Vi alguns pescadores próximos, que usavam uma rede varredoura. Angustiado clamei:

- Venham passar a rede aqui, pois um homem está morrendo afogado!- Veh bin, foi a resposta inesperada, isto é, "Não é con­veniente".

- Não falem se é ou não é conveniente. Venham depres­sa antes que o homem pereça.

- Estamos pescando.

- Eu sei! Mas venham imediatamente e pagarei bem.

- Quanto nos quer dar?

- Cinco dólares, mas não fiquem conversando. Salvem o homem sem demora!

- Cinco dólares não basta - responderam eles. Não o fa­remos por menos de trinta dólares.

- Mas não tenho tanto! - darei tudo que eu tenho.

- Quanto tem o senhor?

- Não sei - porém não é mais do que catorze dólares. "Então os pescadores vieram, passaram a rede no lugar indicado. Logo à primeira vez apanharam o corpo do ho­mem. Mas todos os meus esforços para restaurar-lhe a res­piração foram inúteis. Uma vida fora sacrificada pela indi­ferença dos que podiam salvá-la quase sem esforço."

Ao ouvirem contar esta história, uma onda de indigna­ção passou por todo o grande auditório. Haveria em todo o mundo um povo tão endurecido e interesseiro como esse! Mas ao continuar o seu discurso, a convicção feriu ainda mais o coração dos ouvintes.

- "O corpo então tem mais valor que a alma? Censura­mos esses pescadores, dizendo que foram culpados da mor­te de Pedro, porque era coisa fácil salvá-lo. - Mas que acontece com os milhões que estamos deixando perecer para toda a eternidade? Que diremos acerca da ordem implícita: Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda a criatura? Deus nos diz também: 'Livra os que estão des­tinados à morte, e os que são levados para a matança, se os puderes retirar. Se disseres: eis que não o sabemos; por­ventura aquele que pondera os corações não o considerará? e aquele que atenta a tua alma não o saberá? não pagará ele ao homem conforme a sua obra?'

- "Credes que cada pessoa entre esses milhões da Chi­na, tem uma alma imortal e que não há outro nome debai­xo do céu, dado entre os homens a não ser o precioso nome de Jesus, pelo qual devamos ser salvos? - Credes que Ele,Ele só, é o Caminho, a Verdade e a Vida e que ninguém vai ao Pai senão por Ele? Se assim o credes, examinai-vos a vós mesmos para ver se estais fazendo todo o possível para levar seu nome a todos.

"Ninguém deve dizer que não é chamado para ir à Chi­na. Ao enfrentar tais fatos, todas as pessoas precisam sa­ber se têm uma chamada para ficarem em casa. Amigo, se não tens certeza de uma chamada para continuar onde es­tás, como podes desobedecer à clara ordem do Salvador, para ir? - Se estás certo, contudo, de estares no lugar onde Cristo quer, não por causa do conforto ou dos cuidados da vida, então estás tu orando como convém a favor dos mi­lhões de perdidos da China? Estás tu usando teus recursos para a salvação deles?"

Certo dia, não muito depois de haver regressado à In­glaterra, Hudson Taylor, ao completar a estatística, veio a saber que o número de missionários evangélicos na China diminuira em vez de aumentar. Apesar de a metade da po­pulação pagã estar na China, o número de missionários durante o ano tinha diminuído de cento e quinze para so­mente noventa e um. Começaram a soar aos ouvidos do missionário estas palavras: "Quando eu disser ao ímpio: Certamente morrerás; não avisando tu, não falando para avisar o ímpio acerca do seu caminho ímpio, para salvar a sua vida. aquele ímpio morrerá na sua maldade, mas o seu sangue da tua mão o requererei".

Era um domingo, 25 de junho de 1865, de manhã, à bei­ra-mar. Hudson Taylor, cansado e doente, estava com al­guns amigos em Brighton. Mas não podendo suportar mais o regozijo da multidão na casa de Deus, retirou-se para an­dar sozinho nas areias da maré vazante. Tudo em redor era paz e bonança, mas na alma do missionário rugia uma tempestade. Por fim, com alívio indizível, clamou: "Tu, Senhor, tu podes assumir todo o encargo. Com tua chama­da, e como teu servo, avançarei, deixando tudo nas tuas mãos."

Assim "a Missão do Interior da China foi concebida na sua alma e todas as etapas do seu progresso realizaram-se por seus esforços. Na calma do seu coração, na comunhão profunda e indizível com Deus, originou-se a missão."Com o lápis na mão, abriu a Bíblia e, enquanto as on­das do vasto mar batiam aos seus pés, escreveu as simples mas memoráveis palavras: "Orei em Brighton pedindo vinte e quatro trabalhadores competentes e dispostos, em 25 de junho de 1865".

Mais tarde, recordando-se da vitória dessa ocasião es­creveu:

"Grande foi o alívio de espírito que senti ao regressar da praia. Depois de findar o conflito, tudo era gozo e paz. Parecia que me faltava muito pouco para voar até a casa do senhor Pearse. Na noite desse dia dormi profundamen­te. A querida esposa achou que a visita a Brighton serviu para renovar-me maravilhosamente. Era verdade!"

O vitorioso missionário, juntamente com a família e os vinte e quatro chamados por Deus, embarcaram em Lon­dres, no "Lammermuir", para a China em 26 de setembro de 1865. O anelante alvo de todos era o de erguer a bandei­ra de Cristo nas onze províncias ainda não ocupadas da China. Alguns dos amigos os animaram, mas outros disse­ram: "Todo o mundo ficará esquecido dos irmãos. Sem uma junta aqui na Inglaterra ninguém se importará com a obra por muito tempo. Promessas são fáceis de fazer hoje em dia; dentro de pouco tempo não terão o pão cotidiano".

A viagem levou mais que quatro meses. Acerca de uma das tempestades, um dos missionários escreveu:

"Durante todo o temporal, o senhor Taylor se compor­tou com a maior calma. Por fim os marinheiros recusaram-se a trabalhar. O comandante aconselhou todos a bordo a amarrarem os cintos de salvação, dizendo que o navio não resistiria à força das ondas mais que duas horas. Nessa al­tura, o comandante avançou na direção dos marinheiros com o revólver na mão. O senhor Taylor então aproximou-se dele e pediu-lhe que não obrigasse dessa forma os mari­nheiros a trabalhar. O missionário dirigiu-se também aos homens e explicou-lhes que Deus ia salvá-los, mas que eram necessários os maiores esforços de todas as pessoas a bordo. Acrescentou que tanto ele como todos os passagei­ros estavam prontos a ajudá-los, e que, como era evidente, as vidas deles também corriam perigo. Os homens conven­cidos por esses argumentos começaram a tirar os destroços,ajudados por todos nós; em pouco tempo conseguimos amarrar os grandes mastros, que batiam com tanta força que estavam demolindo um lado do navio".

Foram horas de grande regozijo quando o "Lammer­muir", por fim, aportou, com todos sãos a bordo, em Shanghai. Outro navio que chegou logo após, perdera de­zesseis das vinte e duas pessoas a bordo!

Os missionários iniciaram o ano de 1867 com um dia de jejum e oração, pedindo, como Jabez, que Deus os aben­çoasse e estendesse os seus termos. O Senhor os ouviu dan­do-lhes entrada, durante o ano, em outras tantas cidades! Encerraram o ano com outro dia de jejum e oração. Um culto durou das onze da manhã às três da tarde, sem nin­guém se sentir enfadado. Outro culto se realizou às 8,30 da noite quando sentiram ainda mais a unção do Espírito Santo. Continuaram juntos em oração até a meia-noite, quando celebraram a Ceia do Senhor.

No início de 1867, o Senhor chamou Graça Taylor, filha de Hudson Taylor, para o Lar Eterno, quando ela comple­tava oito anos de idade. No ano seguinte, a senhora Taylor e o filho, Noel, faleceram de cólera. Foi assim que se ex­pressou o pai e marido:

"Ao amanhecer o dia, apareceu à luz do sol o que fora ocultado pela luz de vela - a cor característica da morte no rosto da minha esposa. O meu amor não podia ignorar por mais, não somente o seu estado grave, mas que realmente ela estava morrendo. Ao conseguir acalmar o meu espírito, eu lhe disse:

- Sabes, querida, que estás morrendo?

- Morrendo! Achas que sim? Por que pensas tal coisa?

- Posso ver, que sim, querida. As tuas forças estão se acabando.

- Será mesmo? Não sinto qualquer dor, apenas cansa­ço.

- Sim, estás saindo para a Casa Paterna. Brevemente estarás com Jesus.

"Minha preciosa esposa, lembrando-se de mim e de como eu devia ficar sozinho, em um tempo de tão grandes lutas, privado da companheira com a qual tinha o costume de levar tudo ao trono da graça, disse:- Sinto muito!

Então ela parou, como que querendo corrigir o que dis­sera, porém eu lhe perguntei:

- Estás triste por causa da partida para estar com Je­sus?

"Nunca me esquecerei de como ela olhou para mim e respondeu:

- Oh! não. Bem sabes, querido, que durante mais de dez anos, não houve sombra alguma entre mim e meu Sal­vador. Não estou triste por causa da partida para estar com Ele, mas me entristeço porque terás de ficar sozinho nessas lutas. Contudo... Ele estará contigo e suprirá tudo o que é mister."

"Nunca presenciei uma cena tão comovente" - escre­veu o senhor Duncan. - "Com a última respiração da que­rida senhora Taylor, o senhor Taylor caiu de joelhos, o co­ração transbordando, e a entregou ao Senhor, agradecen­do-lhe a dádiva e os doze anos e meio que passaram juntos. Agradeceu-lhe, também, pela bênção de Ele mesmo a le­var para a sua presença. Então, solenemente dedicou-se a si mesmo novamente ao serviço do Mestre.

Não é de supor que Satanás deixasse a Missão do Inte­rior da China invadir seu território com vinte e quatro ou­tros obreiros, sem incitar o povo a maior perseguição. Fo­ram distribuídos em muitos lugares, impressos atribuindo aos estrangeiros os mais horripilantes e bárbaros crimes, especialmente aos que propagavam a religião de Jesus. Al­voroçaram-se cidades inteiras e muitos dos missionários ti­veram de abandonar tudo e fugir para escapar com vida.

Quase seis anos depois de o grupo do "Lammermuir" haver desembarcado na China, Hudson Taylor estava no­vamente na Inglaterra. Durante esse tempo da obra na China, a missão aumentava de duas estações com sete obreiros, para treze estações com mais de trinta missioná­rios e cinqüenta obreiros, estando separadas as estações, uma da outra, na média de cento e vinte quilômetros.

Foi durante essa visita à Inglaterra que Hudson Taylor se casou com Miss Faulding, também fiel e provada mis­sionária na China.

Acerca de Hudson Taylor, nesse tempo, certa pessoa amiga, escreveu:

"O senhor Taylor anunciou um hino, sentou-se ao har­mônio e tocou. Não fui atraído por sua personalidade. Era de físico franzino e falou com voz mansa. Como os demais jovens, eu julgava que uma grande voz sempre acompa­nhava um verdadeiro prestígio. Mas quando ele disse: 'O­remos e nos dirigiu em oração, mudei de parecer; eu nunca ouvira alguém orar como ele. Havia na sua oração uma ousadia, um poder que fez todas as pessoas presentes se humilharem e sentirem-se na presença de Deus. Falava face a face com Deus como um homem com um amigo. Sem dúvida, tal oração era o fruto de longa permanência com o Senhor; era como o orvalho descendo dos céus. Te­nho ouvido muitos homens orarem, mas não ouvi ninguém como o senhor Taylor e o senhor Spurgeon. Ninguém, de­pois de ouvir como esses homens oravam, pode esquecer-se de tais orações. Foi a maior experiência da minha vida ou­vir o senhor Spurgeon, quando tomou, como se fosse a mão do auditório de seis mil pessoas e as levou ao Santo dos Santos. E ouvir o senhor Taylor rogar pela China era reco­nhecer algo do que significa a súplica fervorosa do justo. "

Foi em 1874 quando, com a esposa, subiam o grande rio Yangtze e ele meditava sobre as nove províncias que se es­tendiam dos trópicos de Burma ao planalto de Mongólia e as montanhas de Tibete, que Hudson Taylor escreveu:

"A minha alma anseia, e o coração arde pela evangeli­zação de centenas de milhões de habitantes dessas provín­cias sem obreiros. Oh! se eu tivesse cem vidas a dar ou gas­tar por eles!"

Mas, no meio da viagem, receberam notícias da morte da fiel missionária Amélia Blatchley, na Inglaterra. Ela não somente cuidava dos filhos do senhor Taylor, mas também servia como secretária da Missão.

Grande foi a tristeza de Hudson Taylor ao chegar à In­glaterra e achar não somente os seus queridos filhos sepa­rados e espalhados, mas a obra da Missão quase paralisa­da. Mas isso não foi ainda a sua maior tristeza. Na sua via­gem pelo rio Yangtze, o senhor Taylor, ao descer a escada do navio, levou uma grande queda, caiu sobre os calcanhares e de tal maneira que o choque ofendeu a espinha dorsal. Depois que chegou à Inglaterra o incômodo da queda agra­vou-se até ele ficar acamado. Sobreveio-lhe então a maior crise da sua vida, justamente quando havia maior necessi­dade de seus esforços. Completamente paralítico das per­nas, tinha de passar todo o tempo deitado de costas!

Uma pequena cama era a sua prisão; é melhor dizer que era a sua oportunidade. Ao pé da cama, na parede, es­tava afixado um mapa da China. E ao redor dele, de dia e de noite, estava a presença divina.

Aí, de costas, mês após mês, permaneceu o nosso herói, rogando e suplicando ao Senhor a favor da China. Foi-lhe concedida a fé para pedir que Deus enviasse dezoito mis­sionários. Em resposta aos seus apelos para oração, escri­tos com a maior dificuldade e publicados no jornal, sessen­ta moços responderam de uma vez. Dentre eles, vinte e quatro foram escolhidos. Ali, ao lado do leito, ele iniciou aulas para os futuros missionários e ensinou-lhes as pri­meiras lições da língua chinesa - e o Senhor os enviou para a China.

Lê-se o seguinte acerca de como o missionário inutiliza­do em corpo, nesse tempo, ficou bom:

"Ele foi tão maravilhosamente curado, em resposta à oração, que podia cumprir com um incrível número de suas obrigações. Passou quase todo o tempo das férias, com seus filhos em Guernsey, escrevendo. Durante os quinze dias que passou ali, apesar de desejar compartilhar da delícia da linda praia, com seus filhos, saiu com eles ape­nas uma vez. Mas as cartas que enviou para a China e ou­tros lugares valiam mais do que ouro."

Certo missionário assim escreveu acerca de uma visita que lhe fez na China:

"Nunca me esquecerei do gozo e da amável maneira com que me saudou. Conduziu-me logo para o 'escritório' da Missão do Interior da China. Devo dizer que foi para mim uma surpresa, ou choque, ou ambas as coisas. Os 'móveis' eram caixotes. Uma mesa estava coberta de inú­meros papéis e cartas. Ao lado do lume havia uma cama, bem arrumada, tendo um pedaço de tapete a servir de cobertor. Nessa cama o senhor Taylor descansava de dia e de noite.

"O senhor Taylor, sem qualquer palavra de desculpa, deitou-se na cama e travamos a palestra mais preciosa da minha vida. Toda a idéia que eu tinha das qualificações para ser um 'grande homem' foi completamente mudada; não havia nele coisa alguma do espírito de superioridade. Vi nele o ideal de Cristo, da verdadeira grandeza, tão evi­dente que permanece ainda no meu coração, através dos anos, até o presente momento. Hudson Taylor reconhecia profundamente que, para evangelizar os milhões da China, era imperioso que os crentes na Inglaterra mostrassem muito mais de abnegação e sacrifício. - Mas como podia ele insistir em sacrifício sem primeiramente praticá-lo na sua própria vida? Assim ele, deliberadamente, cortou da sua vida toda a aparência de conforto e luxo.

"Nas viagens pelo interior da China, ele, invariavel­mente, se levantava para passar uma hora com Deus antes de clarear o dia, às vezes, para depois dormir novamente. Quando eu despertava para alimentar os animais, sempre o achava lendo a Bíblia à luz de vela. Fosse qual fosse o ambiente ou o barulho nas hospedarias imundas, não des­cuidava o hábito de ler a Bíblia. Geralmente em tais via­gens, orava de bruços, porque lhe faltavam as forças para permanecer tanto tempo de joelhos.

- Qual será o assunto do seu discurso, hoje? - pergun­tou-lhe certo crente que viajava com ele, de trem.

- Não tenho certeza; ainda não tive tempo de resolver, respondeu-lhe Hudson Taylor.

- Não teve tempo! - exclamou o homem. - Ora, que faz o senhor a não ser descansar depois de assentar-se aí?

- Não conheço o que seja descansar. - foi a resposta cal­ma que ele deu.

"Depois de embarcarmos em Edinburgo, passei todo o tempo orando e levando todos os nomes dos membros da Missão do Interior da China, e os problemas de cada um, ao Senhor."

Está além da nossa compreensão como no meio de uma das maiores obras de evangelização de toda a história, ele podia dizer:"Nunca fomos obrigados a abandonar uma porta aber­ta, por falta de recursos. Apesar de muitas vezes gastarmos até o último pêni, a nenhum dos obreiros nacionais nem a nenhum dos missionários, faltou o prometido 'pão' coti­diano. Os tempos de provações são sempre tempos aben­çoados e o que é necessário nunca chega demasiado tarde."

Outro segredo do seu grande êxito de levar a mensagem de salvação ao interior da China era a determinação de que a obra não somente continuasse com caráter internacional, mas também, interdenominacional - que aceitasse missio­nários dedicados a Deus, de qualquer nação e de qualquer denominação.

Em 1878, ao regressar de uma viagem, começou a orar pedindo que Deus enviasse mais trinta missionários antes de findar o ano de 1879. Diremos, ao lembrarmo-nos do di­nheiro necessário para pagar as passagens e sustentar tan­tas pessoas, que a sua fé era grande. Pois bem, vinte e oito pessoas, com os corações acesos pelo desejo de salvação dos perdidos na China, confiando em Deus para o seu sustento cotidiano, embarcaram antes de findar o ano de 1878 e mais seis em 1879.

Conversando com um companheiro de lutas, na cidade de Wuchang, Hudson Taylor começou a enumerar os pon­tos estratégicos em que deviam começar logo a evangelizar os dois milhões de habitantes do vale do grande rio Yangt-ze e o do seu tributário, o rio Hã. Com menos de cinqüenta ou sessenta novos obreiros, a Missão não podia dar tal pas­so - e a própria Missão não tinha mais de um total de cem! Contudo, a Hudson Taylor foi dada a fé de pedir outros se­tenta - lembrado das palavras: "Designou o Senhor ainda outros setenta".

"Reunimo-nos hoje para passar o dia em jejum e ora­ção" - escreveu Hudson Taylor em 30 de junho de 1872. - "O Senhor nos abençoou grandemente... Alguns passaram a maior parte da noite em oração... O Espírito Santo nos encheu até nos parecer ser impossível receber mais sem
morrer."

Em certo culto, durante quase duas horas, louvaram ininterruptamente a Deus pelos setenta obreiros já recebidos - pela fé. E, em realidade, foram recebidos mais do que setenta, e dentro do prazo marcado.

O Senhor conduziu a Missão, pouco a pouco para uma visão ainda mais larga - levou os obreiros a pedirem ao Se­nhor outros cem, em 1887. Assim, disse o senhor Stephen­son: "Se me mostrassem uma foto de todos os cem, batida aqui na China, não seria mais real do que realmente é."

Contudo, Hudson Taylor não iniciou precipitadamente o programa de orar e se esforçar para receber mais cem missionários. Como sempre, devia ter certeza da direção de Deus antes de resolver orar e se esforçar para alcançar o alvo.

Seis vezes mais do que o número que pediram, se ofere­ceram para ir! Mas, a Missão rejeitou fielmente a todos que não concordaram com os princípios declarados desde o início. Assim, exatamente o número pedido embarcou para a China. - Não foram cento e um, nem noventa e no­ve, mas exatamente cem.

Depois da visita de Hudson Taylor ao Canadá, aos E.U.A. e à Suécia em 1888 e 1889, a Missão do Interior da China gozou de um dos maiores impulsos para avançar em todos os anais da história de missões. Assim escreveu de­pois, o nosso missionário, acerca do que lhe pesava grande­mente no coração durante toda a sua visita à Suécia:

"Confesso-me envergonhado de que, até essa ocasião, nunca tinha meditado sobre o que o Mestre realmente que­ria dizer ao mandar pregar o Evangelho 'a toda a criatura'. Esforcei-me durante muitos anos, como muitos outros ser­vos de Deus, para levar o Evangelho aos lugares mais dis­tantes; planejei alcançar todas as províncias e muitos dos distritos menores da China, sem compreender o sentido evidente das palavras do Salvador.

"'a toda a criatura'? O número total de comunicantes entre os crentes da China não excedia quarenta mil. Se houvesse outro tanto de aderentes, ou mesmo três vezes mais, e se cada um levasse a mensagem a oito de seus patrícios - mesmo assim, não alcançariam mais de um mi­lhão. 'a toda a criatura'! as palavras abrasavam-lhe o ínti­mo da alma. Mas como a Igreja, e eu mesmo, falhávamos em aceitá-las justamente como Cristo queria! Isso eu percebi então; para mim havia apenas uma saída, a de obede­cer.

"Qual será a nossa atitude para com o Senhor Jesus Cristo quanto a essa ordem? Suprimiremos o título Pe­nhor', que lhe foi dado, para reconhecê-lo apenas como nosso Salvador? Aceitaremos o fato de Ele tirar a penalida­de do pecado, e recusaremos a confessarmo-nos comprados por bom preço, e que Ele tem o direito de esperar a nossa obediência implícita? Diremos que somos os nossos pró­prios senhores, prontos a conceder-lhe apenas o que lhe é devido, a Ele que comprou-nos com seu próprio sangue, com a condição de Ele não pedir demasiado? As nossas vi­das, os nossos queridos, as nossas possessões são somente nossas, não são dele? Daremos o que acharmos convenien­te e obedeceremos à sua vontade somente se Ele não nos pedir demasiado sacrifício? Estamos prontos a deixar Je­sus Cristo nos levar aos céus, mas não queremos que esse homem 'reine sobre nós'?

"O coração de todos os filhos de Deus rejeitará, certa­mente uma afirmação assim formulada. Mas não é verda­de que inumeráveis crentes, em todas as gerações, se com­portaram tal como se isso fosse a base própria para suas vi­das? São poucas as pessoas entre o povo de Deus que reco­nhecem a verdade de que, ou Cristo é o Senhor de tudo, ou então não é Senhor de coisa alguma! Se somos nós que jul­gamos a Palavra de Deus, e não a Palavra que nos julga; se concedemos a Deus somente o quanto quisermos então so­mos nós os senhores e Ele o nosso devedor e, conseqüente­mente, Ele deve ser grato pela esmola que lhe concedemos; deve sentir-se obrigado por nossa concordância aos seus desejos. Se, ao contrário, Ele é Senhor então tratemo-lo como Senhor: 'E por que me chamais, Senhor, Senhor, e não fazeis o que eu digo?'"

Foi assim que Hudson Taylor, sem esperar, alcançou a mais larga visão da sua vida, a visão que dominou a última década de seu serviço. Com os cabelos já grisalhos, após cinqüenta e sete anos de experiência, enfrentou o novo sen­tido de responsabilidade com a mesma fé e confiança que o caracterizavam quando era mais novo. Sua alma ardia ao meditar nos alvos antigos! Ficou ainda mais firme ao exe­cutar a visão de outrora!

Foi assim que sentiu a direção de unificar todos os gru­pos evangélicos, que trabalhavam na evangelização da China, para orarem e se esforçarem para aumentar o nú­mero de missionários, enviando-se à China outros mil, dentro de cinco anos. O número exato enviado à China du­rante esse prazo, foi de mil cento e cinqüenta e três!

Não é, pois, de admitir que as forças físicas de Hudson Taylor começassem a faltar, não tanto pelas privações e cansaço das viagens contínuas, nem pelos esforços incan­sáveis em escrever e pregar, nem pelo peso das grandes e inumeráveis responsabilidades de dirigir a Missão do Inte­rior da China. Os que o conheciam intimamente sabiam que era um homem gasto de tanto amar.

A gloriosa colheita de almas na China aumentava cada vez mais. Mas a situação política do país piorava dia após dia até culminar na Carnificina dos Boxers, no ano de 1900, quando centenas de crentes foram mortos. Somente da China Inland Mission pereceram cinqüenta e oito mis­sionários, e vinte e um de seus filhos.

Hudson Taylor, com a sua esposa, estavam novamente na Inglaterra, quando começaram a chegar telegrama após telegrama avisando-os dos horripilantes acontecimentos na China; aquele coração que tanto amava a cada missio­nário, quase cessou de pulsar. Acerca desse acontecimento assim se manifestou: "Não sei ler, não sei pensar, nem mesmo sei orar, mas sei confiar."

Certo dia, alguns meses depois, Hudson Taylor, com o coração transbordante e as lágrimas correndo-lhe pelas fa­ces, estava contando o que lera em uma carta que acabara de receber de duas missionárias, escrita um dia antes de elas morrerem nas mãos dos boxers. Eis o que ele disse:

"Oh! o gozo de sair de tal motim de pessoas enfurecidas para estar na sua presença, para ver o seu sorriso!" Quan­do pôde continuar, acrescentou: "Elas agora não estão ar­rependidas. Têm a imperecível coroa! Andam com Cristo em vestes brancas, porque são dignas".

Falando acerca de seu grande desejo de ir a Shanghai, para estar ao lado dos refugiados, ele disse: "Não sei se poderia ajudá-los, mas sei que me amam. Se pudessem che­gar-se a mim nas tristezas para chorarmos juntos, ao me­nos poderiam ter um pouco de conforto." Mas ao lembrar-se de que tal viagem lhe era impossível por causa da saúde, a sua tristeza parecia maior do que podia suportar.

Apesar de sentir profundamente a sua incapacidade para trabalhar como de costume, achou grande conforto em estar com a sua esposa, a qual tanto amava. Findara o tempo em que deviam passar longos meses e anos separa­dos um do outro, nas lutas em tantos lugares.

Foi em 30 de julho de 1904 que sua esposa faleceu. "Não sinto nada de dor, nada de dor", dizia ela, apesar da ânsia em respirar. Então, de madrugada, percebendo a an­gústia de espírito do seu marido, pediu-lhe que orasse ro­gando ao Senhor que a levasse logo. Foi a oração mais difí­cil da vida de Hudson Taylor, mas por amor dela, ele orou pedindo a Deus que libertasse o espírito da sua esposa. Logo que orou, dentro de cinco minutos cessou a ânsia e não muito depois ela adormeceu em Cristo.

A desolação de espírito de Hudson Taylor sentiu depois da partida da sua fiel companheira era indescritível. Toda­via, achou indizível paz nesta promessa: "A minha graça te basta." Começou a recuperar as forças físicas e na pri­mavera fez a sua sétima viagem aos E.U.A. Daí fez a últi­ma viagem à China, desembarcando em Shanghai em 17 de abril de 1905.

O valente líder da Missão, depois de tão prolongada au­sência, foi recebido em todos os lugares com grandes mani­festações de amor e estima da parte dos missionários e crentes, especialmente dos que escaparam dos intraduzí­veis espetáculos da insurreição dos Boxers.

Em Chin-Kiang, o veterano missionário visitou o cemi­tério onde estão gravados os nomes de quatro filhos e o da esposa. As recordações eram motivo de grande gozo, isto é, o dia da grande reunião se aproximava.

No meio da viagem, quando visitava as igrejas na Chi­na, sem ninguém esperar, nem ele mesmo, findou a sua carreira na terra. Isso aconteceu na cidade de Chang-sha em 3 de junho de 1905. Sua nora contou o seguinte, sobre esse acontecimento:"O querido papai estava deitado. Como sempre gosta­va de fazer, tirou as cartas, dos queridos, da sua carteira e as estendeu sobre a cama. Baixou-se para ler uma das car­tas perto do candeeiro aceso colocado na cadeira ao lado do leito. Para que ele não se sentisse demasiadamente inco­modado, puxei outro travesseiro e o coloquei por baixo da sua cabeça e assentei-me numa cadeira ao seu lado. Men­cionei as fotografias da revista, Missionary Review, que es­tava aberta sobre a cama. Howard tinha saído para ir bus­car algo para comer, quando papai, de repente, virou a ca­beça e abriu a boca como se quisesse espirrar. Abriu a boca a segunda, e a terceira vez. Não clamou; não pronunciou qualquer palavra. Não mostrou qualquer dificuldade para respirar - nada de ânsia. Não olhou para mim, e não pare­cia cônscio... Não era a morte, era a entrada na vida imor­tal. Seu semblante era de descanso e sossego. Os vincos do rosto feitos pelo peso da luta de longos anos pareciam ha­ver desaparecido em poucos momentos. Parecia dormir como criança no colo da mãe; o próprio quarto parecia cheio de indizível paz."

Na cidade de Chin-Kiang, à beira do grande rio que tem a largura de mais de dois quilômetros, foi enterrado o corpo de Hudson Taylor.

Muitas foram as cartas de condolências recebidas de fiéis filhos de Deus no mundo inteiro. Emocionante foram os cultos celebrados em vários países, em sua memória. Impressionantes foram os artigos e livros impressos acerca das suas vitórias na obra de Deus. Mas as vozes mais des­tacadas, as que Hudson Taylor apreciaria mais, se pudesse ouvi-las, eram as das muitas crianças chineses, que, can­tando louvores a Deus, deitaram flores sobre o seu túmulo.

(extraido do livro hérois da fé)